Daniel Duende é escritor, brasiliense, e tradutor (talvez nesta ordem). Sofre de um grave vício em video-games do qual nunca quis se tratar, mas nas horas vagas de sobriedade tenta descobrir o que é ser um blogueiro. Outras de suas paixões são os jogos de interpretação e sua desorganizada coleção de quadrinhos. Vez por outra tira também umas fotografias, mas nunca gosta muito do resultado.

Duende é atualmente o Coordenador do Global Voices em Português, site responsável pela tradução do conteúdo do observatório blogosférico Global Voices Online, e vez por outra colabora com o Overmundo. Mantém atualmente dois blogues, o Novo Alriada Express e O Caderno do Cluracão, e alterna-se em gostar ora mais de um, ora mais de outro, mas ambos são filhos queridos. Tem também uma conta no flickr, um fotolog e uma gata branca que acredita que ele também seja um gato.

terça-feira, 20 de março de 2007

Pedradas (muito) bem miradas na falácia da política, das cidades, e da beleza desta civilização. por Marcello Pedroso e eu.

"(...)Desde que me dei conta que tudo não passava de um joguinho de cartas marcadas muito do sem vergonha, de que todo esse papo era absolutamente vazio, vazio porque de fato não vai a lugar nenhum e não tem objetivo algum, porque não é relevante de maneira nenhuma, eu disse, e digo, de coração: Foda-se a política.

Não é a pólis a salvação, mas o sintoma mais óbvio de nossa degradação.
Fodeu para todo mundo (perdoe o vocabulário. Mais um motivo para escrever só uma vez sobre isso), mesmo, e não adianta espernear. Vamos nos acostumando com o fato de que quando nossos ancestrais de pouco tempo atrás inventaram de viver aglomerados e de quebra perder o manual de instruções da espécie, fizeram uma grande merda, e depois jogaram tudo no ventilador, e hoje continuamos achando que o problema é o tipo de merda que está sendo jogado na nossa cara.

Eu sou do tipo de pessoa que advoga pela idéia aparentemente absurda de desligar o ventilador da tomada e começar logo a recolher o cocô com as mãos pra fazer um monte de adubo prum novo começo no nosso sítio.(...)"
(trecho do post Política, de Marcello Pedroso, em seu SintropiaEspontânea)

Não é todo dia que encontro gente que tem pensamentos políticos (ou justamente não políticos) que traduzem tão facilmente o que penso. Marcello Pedroso, ou Marcelinho, velho conhecido dos tempos de Casa na Colina e longas partidas de xadrez no Estação 109 regadas a cerveja e excelente conversa, sempre me aparece com grandes sacadas. Mas esta sacada eu não pude deixar de ecoar, até porque é uma reafirmação de tudo que penso sobre este jogo complexo-inviável-absurdo-patético que é a política.

Costumo dizer que na falta de Reis Divinos, é melhor que o povo se governe a si mesmo, pois ninguém mais precisa ou pode fazê-lo. Some-se a isso que precisamos de governos, lideranças artificialmente instituidas e insolúveis nos momentos, simplesmente para resolver problemas absurdos que nós mesmos criamos nos passos tortos desta nossa civilização. Cidades gigantescas, embora tenham seus encantos, são um câncer na carne da terra e na alma de seus moradores. Países, fronteiras, governantes, são abstrações que tristemente nos são materializadas por forças que ora nos pertenciam mas que saíram de nosso controle. Inventamos uma civilização para nos dar uma vida melhor, e com ela inventamos cidades, governos, falsa abundância e problemas que hoje não sabemos como resolver. Onde está a vida melhor que almejávamos? Estão todos felizes?

Não fosse o dinheiro, ninguém seria capaz de acumular muito mais do que precisa. Não fossem os governos que nos tratam como nem o gado deveria ser tratado, com nossa bovina anuência, aprenderíamos -- teríamos que aprender -- a nos tornarmos mais atentos ao que é real e a nos unirmos em busca da sobrevivência e da solução de nossos problemas. Não fossem as cidades, haveria espaço para todos, cada um no seu canto, reunindo-se apenas pela vontade de encontrar ou pela necessidade de colaborar. Em meio a tudo isso, nos tornamos tantos, tão doentes e tão pobres da verdadeira riqueza humana, que começamos até mesmo a acreditar que precisamos dessa merda toda pra viver. Assim é, se nos parece. O dinheiro empobreceu a maioria para enriquecer a minoria. Os governos nos amputam de nossa capacidade de resolver problemas e de nos agruparmos nos conjuntos que bem quisermos, assim como de decidir nossas vidas. As cidades nos enlouquecem e nos atritam ao limite do ódio e da tensão humana, como bichos em jaulas mais ou menos luxuosas, mas ainda assim empilhadas.

Até onde nossa mania por festejar (ou se resignar) à merda de civilização em que nos metemos vai nos impedir de ver que não apenas estamos indo cada vez mais rápido para o mesmo velho lado errado, mas que também estamos levando nosso planeta e a nossa raça à destruição? Você realmente acredita que estamos construindo um mundo melhor? Realmente acredita que algum governante pode tornar o seu mundo melhor, ou que algum modelo econômico pode tornar a distribuição das posses entre as pessoas e a qualidade de vida de todos suficientemente humana? Você realmente acredita nesta nossa civilização? No excesso de SIM engolindo o nosso NÃO, por hora a gente continua colaborando pra tentar tirar a água deste enorme barco furado. Mas um dia este castelo de cartas vai cair e aí sim, graças aos Bons Deuses, vai ser hora de recomeçar. Oxalá, da próxima vez, façamos algo melhor do que esta péssima idéia na qual insistimos há séculos...


Até lá, vão continuar achando que sou um inocente maluco. Acho mais engraçada a parte do inocente, pois para ser são num mundo louco, é necessário ser louco.

2 comentários:

Anônimo disse...

Então, ainda tô pensando num plano pra viver de um jeito diferente, embora seja bem solitário em consequência. Enqto isso a gente vai driblando tudo isso e vivendo uns momentos legais pelo menos.
Mas vale o desabafo e a indignação, concordo plenamente. Pena que talvez nem os nossos bisnetos vejam essa evolução.

E viva a anaquia!

Daniel Duende disse...

Talvez este processo de colapso seja lento, como o gradual desmoronamento de uma ruína. Talvez seja rápido como uma implosão causada pelo apodrecimento das bases. Talvez seja terrível, talvez seja aliviante até para quem não acreditava que seria...

Não sei... mas estamos mesmo vendo o colapso de uma civilização.

Que seja o que os Deuses quiserem.