Daniel Duende é escritor, brasiliense, e tradutor (talvez nesta ordem). Sofre de um grave vício em video-games do qual nunca quis se tratar, mas nas horas vagas de sobriedade tenta descobrir o que é ser um blogueiro. Outras de suas paixões são os jogos de interpretação e sua desorganizada coleção de quadrinhos. Vez por outra tira também umas fotografias, mas nunca gosta muito do resultado.

Duende é atualmente o Coordenador do Global Voices em Português, site responsável pela tradução do conteúdo do observatório blogosférico Global Voices Online, e vez por outra colabora com o Overmundo. Mantém atualmente dois blogues, o Novo Alriada Express e O Caderno do Cluracão, e alterna-se em gostar ora mais de um, ora mais de outro, mas ambos são filhos queridos. Tem também uma conta no flickr, um fotolog e uma gata branca que acredita que ele também seja um gato.

sábado, 15 de outubro de 2005

A virtude corre no sangue dos Bicarato
Aí vai manifesto indignado de Antonio Bicarato, pai de nosso amigo Paulo Bicarato (o velho bica), a respeito da matéria injuriosa da revista Veja sobre a greve de fome do Frei Luiz Flávio Cappio. O sr. Antonio não lê mais a Veja, como não mais a lêem a maioria das pessoas inteligentes que conheço...


"Para muito além da polêmica sobre o São Francisco

Fiquei e continuo indignado, enojado da orquestração de Veja, edição 1926, de 12 de outubro de 2005, contra a heróica atitude de Dom Frei Luiz Flávio Cappio. Tanto que este é o último número da revista em que ponho as mãos e os olhos.

Começando pelos artigos dos Srs. André Petry e Roberto Pompeu de Toledo, que, pobres de espírito, não sabem, ou não querem, distinguir entre matar-se e entregar a vida. Pior: fazem afirmações que só posso atribuir à má fé. Dizer que Dom Cappio é incoerente ? ?Greve de coerência? ? porque ele é contra o aborto e a eutanásia, mas é a favor do suicídio (sic) ?no momento em que quer defender uma boa causa...? é, no mínimo, mostrar-se totalmente ignorante quanto a quem é Dom Cappio. E, se essa ignorância pode ser perdoável a quem só se interessa pela religião para atacá-la, não o é para uma revista do porte de Veja. Sua desfaçatez, Sr. Petry, vai ao extremo ao afirmar que ?a greve de fome de Dom Cappio parece adequar-se melhor ao picadeiro da palhaçada do que à arena do protesto íntegro?. Isso é achincalhar, além da honra do bispo em foco, a honra de seus familiares, dos
demais cidadãos de Guaratinguetá e de todo cidadão de bem que conhece a alma nobre de Dom Cappio. Isso é achincalhar a honra de toda aquela população a quem ele doa a vida, não a partir da greve de fome que fez há poucos dias, mas há pelo menos trinta anos, quando abandonou tudo o que uma família de posses lhe garantia, para doar-se àquele povo pobre e sofrido do Nordeste
brasileiro. Ou o Sr. chamaria de palhaço um São Francisco de Assis?

E que incoerência existe, Sr. Petry, em ter estudado com mestres da Teologia da Libertação e ser contra o aborto e a eutanásia? Acaso conhece o Sr. algum teólogo católico que, aberta e irrestritamente, defenda essas duas formas camufladas de assassinato?

Depois vem o culto Sr. Roberto Pompeu de Toledo tecendo grotesca comparação de Dom Cappio com os homens-bomba do Islã. Ora, Sr. Pompeu, deixar-se explodir para, junto com sua vida, tirar também a vida de dezenas de outras pessoas é a mesma coisa que entregar-se para que uma população inteira, que
há séculos é espoliada de seus direitos mais fundamentais, tenha esses direitos minimamente que seja respeitados? Se é de suicida atitude de Dom Cappio, suicidas também foram Gandhy, Albert Schweitzer, Maximiliano Kolbe, Irmã Doroty e muitos outros.

?A Igreja Católica fez seu ingresso no mundo do suicídio como instrumento da ação política nestes últimos dias, às margens do Rio São Francisco, na pessoa do bispo Luiz Flávio Cappio.? Não foi ?nestes últimos dias?, não, Sr. Pompeu, pois foi sempre contra interesses e poderes políticos que cristãos entregaram suas vidas desde os primórdios da Igreja. Se é suicida um Frei Cappio, suicidas foram todos os mártires da História, suicida foi o próprio Cristo, que veio deliberadamente para morrer por uma causa.

E para ?coroar a obra?, a reportagem assinada por Julia Duailibi, em nome de Veja, é simplesmente escabrosa. Mais que isso: é caluniosa, pois chamar Dom Cappio de ?homem vaidoso e consciente do espetáculo que protagonizava? é jogar na lata de lixo exatamente a virtude que mais o caracteriza, desde a vida de seminário, em sua formação, até os dias de hoje: a humildade. Antes de mexer assim com a dignidade de uma pessoa, Sra. Julia, pesquise um pouco mais. Uma simples entrevista não a autoriza a desmoralizar assim quem quer que seja.

De mais a mais, o tempo dirá se o gesto de Dom Cappio resultou em nada. Momentaneamente, a Sra. pode até ter acertado. Não entenda, porém, momentaneamente dentro da pobreza e finitude do pensar humano. O Senhor da História é paciente. Há milhares e milhares de anos, desde o primeiro ser humano, Ele só quer semear o bem no coração de cada homem, de todos os homens. É exatamente o aparente fracasso de Cristo na cruz que até hoje
atrai milhões e milhões em seu seguimento.

Quanto a ti, Veja, porque és parcial e escandalosamente tendenciosa, definitivamente adeus!

Antonio Bicarato"


Como disse em comentário ao post do Alfarrábio onde o Jovem Velho Bica nos apresentou este texto.

daniel duende comentou:

Embora a princípio um crítico feroz do catolicismo (e de todos os outros "ismos" descendentes das idéias de Paulo, aquele cara que caiu do cavalo e virou porta voz de Cristo) me emociono com as palavras coerentes, pias e profundamente inteligentes do pai de meu grande amigo Bicarato.

Ao senhor Antônio devo meu profundo respeito e completo apoio por sua coerência e palavras muito oportunas e bem colocadas. Se mais cristãos fossem como é o Frei Cappio, como o bom Antônio Bicarato e principalmente como o foi o bom Francisco de Assis, certamente o rumo da instituição que hoje considera-se proprietária do legado espiritual de J. Cristo seria bem diferente...

... Como também seria diferente a revista Veja, e tantas outras, se mais jornalistas tivessem a integridade, seriedade e honestidade do filho de Antônio, o nosso amigo Paulo Bicarato.

E tenho dito.

Vou beber com o Jovem Velho Bica (filho), pois este é um privilégio do qual não abro mão.

Abraços apertados a todos os Bicaratos.
às 15:49 de 15.10.2005


E, como disse, tenho dito...

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