Daniel Duende é escritor, brasiliense, e tradutor (talvez nesta ordem). Sofre de um grave vício em video-games do qual nunca quis se tratar, mas nas horas vagas de sobriedade tenta descobrir o que é ser um blogueiro. Outras de suas paixões são os jogos de interpretação e sua desorganizada coleção de quadrinhos. Vez por outra tira também umas fotografias, mas nunca gosta muito do resultado.

Duende é atualmente o Coordenador do Global Voices em Português, site responsável pela tradução do conteúdo do observatório blogosférico Global Voices Online, e vez por outra colabora com o Overmundo. Mantém atualmente dois blogues, o Novo Alriada Express e O Caderno do Cluracão, e alterna-se em gostar ora mais de um, ora mais de outro, mas ambos são filhos queridos. Tem também uma conta no flickr, um fotolog e uma gata branca que acredita que ele também seja um gato.

sábado, 29 de janeiro de 2005

Rascunhos descartados...
Eu tenho uma enorme dificuldade de jogar coisas fora. Seja coisas tangíveis, como papeis de anotação e lembranças de lugares ou momentos, seja coisas intangíveis como fotos antigas de pessoas que nunca mais verei e... fragmentos extirpados de contos.

"...Marcos se pegou pensando que acreditava que nunca teria que arrombar uma porta na vida. De qualquer forma, como não sabia mais ao certo no que acreditava, limitou-se então a chutar a porta de entrada do apartamento. Não sabia com certeza como viera parar ali. Tratava-se da casa de Selina, ele sabia, mas não se recordava se esta o havia dado o endereço da casa antes. De qualquer forma, ele entrou, pisando na porta e nos enfeites de natal que ainda estavam lá, grosseiramente fora de época. Que diferença fazia agora?

Exceto pela porta derrubada e os cacos de um vaso derrubado que ainda corriam pelo chão, a pequena sala do apartamento parecia bastante pacata. Mesa de jantar com arranjo de flores, bibelôs sobre uma mesa de centro, licores na estante e uma árvore de natal. A paz do lugar era perturbada por ruídos que vinham do corredor. Não era surpresa que a casa inteira estivesse agora acordada, com todo o barulho da porta sendo derrubada.

Esperando ver familiares, armados ou não, correndo pelo corredor em meio ao absurdo da situação, Marcos ficou surpreso ao perceber que apenas uma jovem mulher negra como alcatrão o olhava. À guisa de arma segurava com as duas mãos um guarda chuva florido. Seus olhos eram apavorados demais para oferecer qualquer ameaça. Neste momento Marcos estava surpreso demais com os próprios atos para fazer qualquer coisa também. A cena tensa embora ridícula permaneceu por longos segundos, até que os olhos preguiçosos, dopados, de Selina apareceram no final do corredor. Ela também parecia não entender o que estava acontecendo.

Por todos aqueles segundos Marcos antecipou um confronto patético com a moça do guarda chuva, assustado demais para perceber o ridículo da situação. Mas este confronto não aconteceu. Selina cambaleou pelo corredor e colocou-se frente à mulher negra, e ficou a fitar Marcos com um olhar ainda embasbacado, talvez por conta dos tais remédios..."

(rascunho descartado da sétima parte de minha fábula O Cavaleiro e o Dragão.)


Nada está tão errado a ponto de não merecer existir.
Nada está tão certo a ponto de não ser questionado.

"Na verdade nada é uma palavra esperando tradução"

é.

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