Daniel Duende é escritor, brasiliense, e tradutor (talvez nesta ordem). Sofre de um grave vício em video-games do qual nunca quis se tratar, mas nas horas vagas de sobriedade tenta descobrir o que é ser um blogueiro. Outras de suas paixões são os jogos de interpretação e sua desorganizada coleção de quadrinhos. Vez por outra tira também umas fotografias, mas nunca gosta muito do resultado.

Duende é atualmente o Coordenador do Global Voices em Português, site responsável pela tradução do conteúdo do observatório blogosférico Global Voices Online, e vez por outra colabora com o Overmundo. Mantém atualmente dois blogues, o Novo Alriada Express e O Caderno do Cluracão, e alterna-se em gostar ora mais de um, ora mais de outro, mas ambos são filhos queridos. Tem também uma conta no flickr, um fotolog e uma gata branca que acredita que ele também seja um gato.

quinta-feira, 22 de setembro de 2005

blogs como terapia
aproveitando a descoberta um tanto óbvia da AOL, de que a maioria dos blogueiros escreve sobre as próprias vidas e os próprios problemas muito mais do que sobre as questões coletivas e mundiais, aqui vão meus two-cents a respeito do assunto...

Eu não tinha nada para fazer naquela madrugada de 19 para 20 de abril de 2002. Tinha saído no dia anterior, tomado umas cervejas com uns amigos, e estava ainda meio de ressaca. Dando uma rodada na internet, de saco cheio de conversar no mIRC e sem nenhuma página interessante para ver, resolvi visitar o tal "blog" de uma amiga. Achei interessante o que ela fazia, escrevendo textos bem humorados comentando sobre coisas da vida dela. Situações nas quais eu por vezes estava presente, ou ao menos já havia ouvido falar (posto que Brasília era, é e provavelmente sempre será a maior cidadezinha de interior de todo o Brasil). Repentinamente me deu vontade de fazer um blog, e foi isso que eu fiz.

Não foi o poder de comunicação dos blogs, ou a integração humana representada pela blogosfera, ou a oportunidade de dar a minha versão sobre quaisquer fatos que me motivou a fazer um blog. Foi, antes de mais nada, a oportunidade de falar o que bem quisesse, mesmo que fosse besteira, a respeito de minha vida e da vida de meus amigos em um ambiente público. Foi um misto de vaidade e de tesão de escritor desocupado. E então, assim, nasceu o Alriada Express.

Depois disso, rodando pela blogosfera e conhecendo mais e mais blogues, eu fui começando a entender o poder que estes adoráveis negocinhos possuem. Comecei entender a blogosfera, as dinâmicas das conversas (e das linkadas) que vão acontecendo entre os blogs. Testemunhei a explosão de blogues entre os jornalistas, entre os geeks, entre as adolescentes secundaristas (que era, por um bom tempo, meu segmento predileto de blogueiras por motivos que não preciso citar) e entre tantos outros grupos. Em algum tempo eu vi que quase todo o mundo à minha volta estava blogando. Alguns, como o meu irmão, começaram a escrever blogs bastante orientados. Outros usavam seus blogs como ferramenta política, ou de formação de opinião. Havia os blogs temáticos sobre jogos, sobre poesia (como o blogue de nosso querido ciborgue metal, cujo link acabei de perceber não estar funcionando), sobre várias coisas. A maioria continuou sendo, entretanto, de blogs que eram por excelência sobre as próprias vidas dos blogueiros.

E isso não é pouco, nem é nem por um segundo uma coisa menor. Falar sobre a própria vida, e fazer isso com clareza e sobretudo com bom humor e classe, é uma habilidade muito preciosa em um ser humano. Falar sobre seus problemas, mesmo sem clareza ou classe, já é um grande passo para aprender a lidar com eles. Por vezes é uma literatura sem interesse geral (por que diabos me interessaria sobre a vida de uma punkzinha do Rio Grande do Sul, se nem a conheço?), mas que pode ser preciosa não só como uma janela para a alma do blogueiro, mas também como uma forma de representação social deste. Foi então que comecei a desenvolver as minhas primeiras teorias sobre "blogs como representações eletrônicas dos indivíduos" (e infelizmente não consegui guardar nenhum texto sobre isso para mostrar), e a cada dia elas se confirmam mais e mais.

Blogar é um ato libertário, não interessa se vc está blogando sobre a situação política do seu país, as movimentações da indústria de conteúdo cultural dos EUA, sobre os livros e autores que te marcaram ou sobre como você se divertiu na última festa em que você foi. É um ato de libertade de expressão, onde você tem uma ferramenta onde pode publicar o que quiser dizer - qualquer coisa - e ser lido por quem se interessar. Com a indexação dos blogs no Google e outros mecanismos de busca, até mesmo pessoas que nunca ouviram falar de você podem eventualmente vir parar em seu blog e descobrir que há alguém que pensa como eles, ou ao menos que pensa de uma forma que os interessa (ou mesmo os causa repulsa, o que é também interessante...).

Como ciber-cara assumido que sou, assumo de bom grado a influência que a internet teve na minha vida social, na estruturação das minhas relações e mesmo na minha forma de ver o mundo (sem falar de sua importância no meu trabalho...). Boa parte desta influência se deu a partir de meu blog. Inúmeras foram as pessoas que conheci (pessoalmente ou não) por causa dele. De certa forma tenho hoje o meu emprego por causa dos blogs, genericamente, e por causa do meu blog específicamente. E tudo isso começou, e nunca deixou de ser, por causa de um brinquedinho que resolvi experimentar numa noite entediada de abril, em cima de uma colina, na cidadezinha de Brasília.

Blogs podem ser, na maior parte das vezes, lentes para se enxergar dentro dos umbigos dos blogueiros...
Mas que lentes maravilhosas eles são.


Viva os blogues! :)

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