Daniel Duende é escritor, brasiliense, e tradutor (talvez nesta ordem). Sofre de um grave vício em video-games do qual nunca quis se tratar, mas nas horas vagas de sobriedade tenta descobrir o que é ser um blogueiro. Outras de suas paixões são os jogos de interpretação e sua desorganizada coleção de quadrinhos. Vez por outra tira também umas fotografias, mas nunca gosta muito do resultado.

Duende é atualmente o Coordenador do Global Voices em Português, site responsável pela tradução do conteúdo do observatório blogosférico Global Voices Online, e vez por outra colabora com o Overmundo. Mantém atualmente dois blogues, o Novo Alriada Express e O Caderno do Cluracão, e alterna-se em gostar ora mais de um, ora mais de outro, mas ambos são filhos queridos. Tem também uma conta no flickr, um fotolog e uma gata branca que acredita que ele também seja um gato.

quinta-feira, 30 de março de 2006

Aventuras na Cidade Seca, que vira um Rio quando chove...
o divertido caminho do Pier21 até o Ministério da Cultura, debaixo de um dilúvio.

A chuvarada caindo sobre o Lago Sul estava linda. Eu fumava um cigarro com o DP, em meio ao vento e os respingos que escapavam da cobertura do Pier21 e nos lembravam de que aquela cena era real. Havia poesia naquela chuva, e minhas memórias se misturavam os as imagens... chuva... vento... ilhas distantes e o gosto de estar vivo...

Mas então já era hora de ir embora. A necessidade de ir para o trabalho invadia o momento poético, e então era hora de enfrentar a chuva em vez de me enamorar dela.

Chegar até o carro foi simples. Sair com o carro do estacionamento, também foi um bocado simples, mas no momento em que pegamos a pista, descobrimos que aquela seria uma pequena aventura. Os vidros eternamente embaçados pela flora interna do Brutus não me permitiam ver nada, e somando-se a isso a chuva que caía, eu estava dirigindo apenas com meus instintos... scary!

A água cascateava pelos barrancos, vindas das embaixadas, vindas da cidade alta, e cruzavam a pista num jorro marrom com mais de 30 centímetros de profundidade. Alguns carros estavam parados sobre o meio fio invisível, outros enfrentavam a enxurrada. Naveguei até o retorno, um caminho que em dias secos faria em segundos, por um tempo que parecia ser interminável. Sem ver se vinham carros, tendo apenas uma vaga noção do Peugeot que ia logo à frente do Brutus... e da água por todos os lados, em cima e em baixo. Lembrei-me novamente da fuga da tempestade... usei meus instintos e fiz o retorno.

Tínhamos então ainda a intenção de ir para o Aeroporto, resolver alguns problemas com passagens. Mas os planos mudaram quando embicamos o carro no rumo do fim da Asa e percebemos a cor do céu. Era o coração da chuva. Navegamos então, meio às cegas, entre cascatas de água barrenta e de asfalto muito preto e escorregadio, até o desvio que nos levaria rumo à cidade alta e ao Ministério. Por vezes pensei que o Brutus iria parar, com o motor encharcado e envolvdo por água, mas ele aguentou firme até a subida. O sistema de servo-freio, encharcado, parou de funcionar, me deixando a opção de literalmente segurar o carro no pé a cada vez que tinha que parar. E foi assim que subimos para a L2, acreditando que lá, enfim, estaríamos em terreno meio alagado. Estávamos enganados...

Á beira do Setor de Autarquias sul o trânsito havia se transformado em um caos completo. Mais dezenas de carros parados sobre o meio fio que havia desaparecido debaixo da água barrenta, e mais de 100 metros de lagoa até o outro lado da pista. Carros parados soltando fumaça, carros cruzando a pista meio às cegas e a chuva que caía. Por um segundo fiquei até com medo, mas então o senso de aventura me pegou de vez. Joguei a primeira marcha e segui em frente, por entre os carros, por entre a chuva, com um único pensamento na cabeça: "Brutus tem 100 cavalos de força e é feito de metal duro, podem bater, pode vir água... eu vou chegar do outro lado!".

Quando cheguei no Ministério ainda estava tomado pelo senso de aventura. Me lembrei como tinha medo de dirigir na chuva, medo de qualquer coisa que fosse arriscada ou fora da rotina tranquila à qual eu havia me acostumado. Eu era muito bobo. A vida cotidiana nos mata aos poucos. São as pequenas intromissões do caos, do inesperado, que nos mantém vivos e alertas à beleza das coisas...

Vocês viram como foi linda a chuva?
O céu está lindo agora mesmo, e você está aí na frente de um computador...


Por mim eu estaria andando na chuva,
pq a chuva é mãe e abraça...

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