Acho que está na hora de colocar um novo blog no ar...
(o PbE talvez seja uma boa matéria prima...)
Duende é atualmente o Coordenador do Global Voices em Português, site responsável pela tradução do conteúdo do observatório blogosférico Global Voices Online, e vez por outra colabora com o Overmundo. Mantém atualmente dois blogues, o Novo Alriada Express e O Caderno do Cluracão, e alterna-se em gostar ora mais de um, ora mais de outro, mas ambos são filhos queridos. Tem também uma conta no flickr, um fotolog e uma gata branca que acredita que ele também seja um gato.
quarta-feira, 30 de junho de 2004
Buscas bizarras?
Referring URL: http://www.google.co...=pt-BR&ie=ISO-8859-1 Search Engine: google.com.br Search Words: daniel carvalho estranho |
They love me yeah yeah yeah... :)
O Cavaleiro e o Dragão (Segunda Parte)
Uma das fábulas internas do Duende.
Leia a primeira parte de O Cavaleiro e o Dragão
"Não é fácil montar um dragão. As escamas que cortam suas mãos, o movimento do pescoço viril a cada batida de asas e o vento que ameaça derrubá-lo ao mesmo tempo que o excita. O medo da altura e o medo da fera. Amarath sente a sua excitação se dissolver lentamente em pavor, mas ele não pode parar. Ele é um Cavaleiro, um montador de dragões, um membro da mais alta casta digno agora do mais alto respeito, e está muito alto nos ares também para desistir. O dragão, sorriso de mil dentes abertos ao vento em um prazer draconiano ao cortar os ares, parece divertir-se. O vento seca as lágrimas de Amarath.
É solitário no topo do mundo. O mundo que ele conhecia agora está atrás e abaixo, as montanhas o encaram como um igual, mas ele sente-se muito pequeno. Vilas, rios, árvores, vidas passam lá embaixo enquanto ele apenas se agarra ao tronco de escamas verdes no qual está montando. Sua respiração entrecortada e difícil, lágrimas, vento e o cheiro de cinzas tomam o seu corpo. Ele pensa na vida que tinha, no treinamento de cavaleiro, em todas as dificuldades que enfrentou para estar alí, e então todos os seus pensamentos são interrompidos pelo esforço de manter-se seguro ao dragão quando este descreve uma curva descendente. O vento leva os pensamentos de Amarath.
O mundo distante do lá embaixo parece crescer de forma estonteante. A clareira entre as montanhas, suas árvores talvez balançando ao vento (ou será a trepidação do corpo do dragão ao cortar o ar cada vez mais rápido?) e o altar de pedra. A cabeça de Amarath dói, assim como suas pernas desacostumadas ao esforço de manter-se no dorso de um dragão em vôo rápido por tanto tempo. Ele se lembra da noite, que pode ter sido há horas ou dias atrás, em que viu o dragão pela primeira vez. E então apenas se agarra com todas as forças quando sua verde montaria estica as pernas para pousar no chão entre as colunas de pedra e as enormes árvores. Amarath não chora mais, está além de todos os sentimentos de menino. Ele apenas está lá. Ele e seu dragão.
Ele sabe que deve deixar o dorso do dragão agora. Sustentar-se novamente com suas pernas. Mas elas recusam a sustentá-lo e nos primeiros passos de Amarath em terra firme, ele realmente encontra a terra. Deitado de costas com o céu azul sem nuvens como sua única visão, ele sente um turbilhão de sentimentos confusos aproximando-se como gralhas sobre a carniça de sua alma de menino. Um som terrivel, raspado, de pedras se arrastando e carvões chiando em fornalhas corta os pensamentos de Amarath. O dragão está rindo.
- "É agora que começa, menino. Levante-se." Disse o dragão. Sua voz era grossa e um pouco rouca, e também parecia feita de pedras e carvões, e ao mesmo tempo também parecia meio verde.
Amarath sabia. Sabia onde estava e o que aconteceria agora. A primeira parte do aprendizado de cavaleiro, montador de dragões, se dava entre os homens. A segunda parte e o teste final acontecia em uma das muitas clareiras antigas das montanhas. Dragão e seu cavaleiro, ali, selariam seu pacto. Amarath se levantou, vertendo uma última lágrima de medo e emoção, sob o olhar verde e alaranjado do dragão. Dalí o menino sairia morto, uma lembrança. Dali sairia um dragão e um cavaleiro, ou apenas um dragão.
Assim era a tradição do povo de Amarath. Então alguma coisa nele sorriu. Era o dragão."
Esta fábula continua...
terça-feira, 29 de junho de 2004
Um conto de Neil Gaiman
Ao começar a escrever fábulas, entro no terreno de mestres. Mestres como Neil Gaiman.
Aqui eu presto, humildemente, meu respeito ao mestre.
Um conto, uma adaptação de uma história que ouvimos quando crianças
Como muitas coisas que nos contam quando crianças,
ela pode ser mentira.
Neve, Vidro, Maçãs
Uma adaptação por Neil Gaiman
Eu não sei que espécie de coisa ela é. Nenhum de nós sabe. Ela matou sua mãe ao nascer, e nunca é demais lembrar sua culpa por isso.
Dizem que sou sábia, mas estou longe disso. Tudo que previ foram fragmentos, momentos congelados e presos em poças d'água ou no vidro do meu espelho. Se eu fosse sábia, não teria tentado mudar o que vi. Se eu fosse sábia, teria me matado antes mesmo de encontrá-la, antes mesmo de tê-lo conquistado. Sábia, e bruxa, ou assim o dizem, e eu tinha visto o rosto dele nos meus sonhos e pensamentos por toda a minha vida: dezesseis anos a sonhar com ele, antes do dia em que ele parou seu cavalo perto da ponte, naquela manhã, e perguntou meu nome. Ele me ajudou a montar no seu altivo cavalo, e fomos juntos para minha pequena propriedade no campo, meu rosto enterrado no dourado dos seus cabelos. Ele me pediu o que eu tinha de melhor; era seu direito, por ser rei.
Sua barba era de um vermelho-bronze à luz da manhã, e eu o conheci, não como um rei, pois eu não sabia nada sobre reis então, mas como meu amor. Ele teve de mim tudo o que queria - é um direito dos reis - mas me retribuiu no dia seguinte, e na noite também: sua barba tão vermelha, seu cabelo tão dourado, seus olhos do azul de um céu de verão, sua pele bronzeada, com a cor gentil do trigo maduro.
Sua filha era só uma criança: não mais que cinco anos de idade quando eu cheguei ao palácio. Um retrato da sua mãe morta pendia da parede do seu quarto, na torre: uma mulher alta, seu cabelo da cor do ébano, os olhos castanhos. Sua pálida filha não parecia descender dela.
A garota não fazia suas refeições conosco. Eu não sei em que lugar do palácio ela comia. Eu tinha meus próprios aposentos. Meu marido, o rei, também. Quando ele me queria, ele mandava me procurar, e eu ia até ele, e lhe dava prazer, e também recebia um pouco.
Uma noite, vários meses após eu ser levada ao palácio, ela veio aos meus aposentos. Estava com seis anos. Eu bordava à luz do lampião, apertando meus olhos à sua fumaça e à sua parca iluminação. Quando levantei os olhos, ela estava ali.
- Princesa?
Ela não disse nada. Seus olhos eram negros como o carvão, negros como seus cabelos; seus lábios eram mais vermelhos que o sangue. Ela olhou para mim e sorriu. Seus dentes pareceram afiados, mesmo ali, à luz do lampião.
- O que você está fazendo fora do seu quarto?
- Estou com fome - ela disse, como qualquer criança. Era inverno, um tempo em que comida fresca é como um sonho de calor e luz do sol; mas eu tinha cordões de maçãs, descaroçadas e secas, penduradas nas vigas do meu aposento, e puxei uma para ela.
- Tome.
O outono é a época de secar, de preservar, a época de colher maçãs e gordura de ganso. O inverno é a época da fome, da neve e da morte, e é a época de Festival, quando esfregamos gordura de ganso na pele de um porco e o
recheamos com as maçãs colhidas no outono, e então o assamos ou grelhamos, e organizamos o festival enquanto ele estala no fogo.
Ela pegou a maçã seca e começou a mordiscá-la, com seus dentes amarelos e afiados.
- Está boa?
Ela assentiu. Eu sempre tive medo da princesinha, mas naquele momento me aconcheguei a ela e com meus dedos, gentilmente, acariciei seu rosto. Ela olhou para mim e sorriu - ela sorria raramente - , e então fincou seus dentes na base do meu polegar, tirando sangue.
Eu ia começando a gritar, de dor e surpresa; mas ela olhou para mim e eu caí em silêncio.
A princesinha fixou sua boca à minha mão, e lambeu, chupou, sugou. Quando terminou, deixou meus aposentos. Diante do meu olhar, a perfuração feita por ela começou a se fechar, a cicatrizar, a sarar. No dia seguinte, ela era como uma cicatriz antiga: eu poderia ter cortado minha mão com um canivete, quando era criança.
Eu havia sido congelada por ela, possuída e dominada. Aquilo me assustou, mais do que o sangue de que ela havia se alimentado. Depois daquela noite, eu trancava meus aposentos ao anoitecer, barrando a porta com uma tranca de carvalho, e pedi ao ferreiro que fizesse barras de aço e as colocasse nas minhas janelas.
Meu marido, meu amor, meu rei, passou a me procurar cada vez menos, e quando eu ia a ele o encontrava atordoado, indiferente, confuso. Ele não conseguia mais fazer amor como um homem, e não me permitia dar-lhe prazer com minha boca; a única vez que tentei, ele se sobressaltou violentamente, e começou a chorar. Eu retirei minha boca e o abracei com força, até os soluços pararem, e ele dormiu, como uma criança.
Enquanto ele dormia, corri meus dedos pela sua pele. Estava coberta de muitas cicatrizes antigas. Mas eu não me recordava de nenhuma cicatriz na época da nossa côrte, exceto uma, no seu quadril, onde um urso o havia ferido na sua juventude.
Logo ele era apenas uma sombra do homem que eu havia conhecido e amado naquele dia, na ponte. Seus ossos estavam aparecendo sob a pele, azuis e brancos. Eu estava com ele nos seus momentos finais: suas mãos estavam frias como pedra, seus olhos de um azul leitoso, seu cabelo e barba escassos e opacos. Ele morreu sem tremer, sua pele picada e pustulenta da cabeça aos
pés com cicatrizes minúsculas.
Ele já não pesava quase nada. O chão já estava bem congelado então, e não pudemos cavar seu túmulo. Então fizemos um marco de rochas sobre o corpo, como um memorial, pois restava muito pouco dele para proteger da fome das feras e dos pássaros.
E então eu era rainha.
E era tola, e jovem - apenas dezoito verões tinham se passado desde que vi a luz do sol pela primeira vez - e não fiz o que faria se fosse agora.
Se fosse agora, é verdade que eu teria arrancado seu coração. Mas também teria arrancado sua cabeça, braços e pernas. Eu a teria estripado. E teria assistido, na praça da cidade, enquanto o carrasco preparasse o fogo aos berros, assistido sem nem piscar enquanto ele entregasse cada parte dela ao fogo. Eu colocaria arqueiros ao redor da praça, que iriam atirar em cada pássaro ou animal que se aproximasse das chamas, qualquer corvo, cachorro, falcão ou rato. E não fecharia meus olhos até que a princesa virasse cinzas, e que um vento gentil pudesse espalhá-la como neve.
Eu não fiz nada disso, e nós pagamos por nossos erros.
Dizem que fui enganada; que aquele não era o coração dela. Que era o coração de um animal - um cervo, talvez, ou um urso. Dizem isso, mas estão enganados.
E alguns dizem (mas quem mentiu foi ela, e não eu) que me foi dado o seu coração, e que eu o comi. Mentiras e meias-verdades caem como neve, cobrindo as coisas que eu me lembro e as coisas que vi. Uma paisagem, irreconhecível depois de uma tempestade de neve; foi o que ela fez da minha vida.
Havia cicatrizes no meu amor, nas coxas do pai dela, nos seus testículos, e no seu membro, quando ele morreu.
Eu não fui com eles. Pegaram-na durante o dia, enquanto ela dormia e estava mais enfraquecida. Levaram-na para o coração da floresta, e lá abriram sua blusa e cortaram fora o seu coração, deixando-a morta, numa vala, para a floresta engolir.
A floresta é um lugar escuro, a fronteira de muitos reinos; ninguém seria tolo o suficiente para reclamar jurisdição sobre ela. Foras-da-lei viviam lá. Ladrões viviam lá, e lobos também. Alguém poderia cavalgar por ela uma dúzia de dias e nunca ver uma alma que fosse, mas haveriam olhos sobre a pessoa o tempo inteiro.
Eles me trouxeram o coração dela. Eu sabia que era o dela - um coração de porca ou de corça não teria continuado pulsando e batendo depois de ter sido arrancado fora, como aquele.
Eu o levei para os meus aposentos. Não o comi; pendurei-o nas vigas sobre a minha cama, e preenchi a distância entre ambos com frutinhas do mato, vermelho-alaranjadas como o peito do tordo, e com cordões de alho.
Lá fora, a neve caía, cobrindo as pegadas dos meus caçadores, cobrindo seu corpinho na floresta onde ele jazia.
Pedi ao ferreiro que removesse as barras de aço das minhas janelas, e passei algum tempo no meu quarto, cada tarde naqueles curtos dias de inverno, perscrutando a floresta, até a escuridão cair.
Havia, como eu já mencionei, o povo da floresta. Eles saíam, alguns deles, para a Feira de Primavera: um povo mesquinho, animalesco e perigoso. Alguns eram atrofiados - anões, aleijados, corcundas. Outros tinham os dentes enormes e olhares vagos de idiotas. Alguns tinham dedos como barbatanas ou patas de caranguejo. Eles se arrastavam para fora da floresta a cada ano, na Feira da Primavera, após a neve derreter.
Quando eu era uma mocinha, trabalhei na Feira, e me assustava com eles, aquele povo da floresta. Eu lia a sorte para os visitantes da Feira, numa poça de água parada; e mais tarde, quando estava um pouco mais velha, num disco de vidro polido incrustado em prata - um presente de um mercador cujo cavalo desgarrado eu tinha encontrado através de uma poça de tinta.
Os guardadores do estábulo da Feira tinham medo do povo da floresta, pois eles roubavam suas coisas guardadas nas tábuas expostas do estábulo: pedaços de pão de gengibre, ou cintos de couro, que ficavam pregados com grandes pregos de ferro nas madeiras. Diziam que se seus artigos não estivessem pregados, o povo da floresta os pegaria e fugiria, mordiscando o pão e
açoitando o ar com os cintos.
O povo da floresta tinha dinheiro, todavia; uma moedinha aqui, outra ali, às vezes já esverdeada pelo tempo ou pela terra, a face desconhecida até pelos mais velhos deles. Também tinham coisas para comerciar, e assim a feira continuava, servindo proscritos, anões e ladrões (se fossem silenciosos) que pilhavam dos raros viajantes vindos das terras além da floresta, ou dos ciganos, ou apanhavam cervos (isso era roubo aos olhos da lei, os cervos pertenciam à rainha).
Os anos passaram lentamente, e meu povo dizia que eu os governava com sabedoria. O coração ainda pendia sobre minha cama, pulsando gentilmente na noite. Se ainda havia alguém que pranteava a criança, eu não tinha evidência: tinham terror dela, e se consideravam livres da sua presença.
As Feiras da Primavera se sucediam; cinco delas, cada uma mais triste, pobre e pior do que a anterior. Poucos do povo da floresta saíam para comprar. Aqueles que vinham pareciam subjugados e apáticos. Os guardadores do estábulo deixaram de pregar seus pertences nas tábuas. E por volta do quinto ano, só um punhado do povo da floresta veio - uma pequena e assustada turba de homenzinhos peludos, e ninguém mais.
O Lorde da Feira e seu pajem vieram a mim depois que a feira acabou. Eu o havia conhecido de passagem, antes de me tornar rainha.
- Eu não venho a você como minha rainha - ele disse.
Eu não disse nada. Só escutei.
- Eu venho a você porque você é sábia - continuou - Quando você era criança, encontrou um potro desgarrado olhando numa poça de tinta; quando era uma donzela, encontrou um infante perdido que havia vagado para longe de sua mãe, olhando naquele seu espelho. Você sabe segredos, e consegue encontrar coisas perdidas. Minha rainha - ele perguntou - o que está levando o povo da floresta? No próximo ano não haverá Feira da Primavera. Os viajantes de outros reinos se tornaram escassos, e o povo da floresta está quase desaparecido. Outro ano como este, e nós deveremos morrer de fome.
Ordenei à minha serva que trouxesse o meu espelho. Ele era simples, um disco de vidro polido incrustado em prata, que eu guardava envolto numa pele de corça, dentro de uma arca em meu quarto.
Trouxeram-no para mim, e eu olhei.
Ela agora estava com doze anos, e não era mais uma criança. Sua pele ainda era pálida, seus cabelos e olhos negros como carvão, seus lábios vermelhos como sangue. Ainda usava as roupas com que tinha deixado o castelo pela última vez - a blusa, a saia - apesar de elas estarem já muito gastas e remendadas. Sobre elas, usava uma capa de couro, e em vez de botas, usava sacos de couro, amarrados com cordões, em seus pés minúsculos. Ela estava parada na floresta, atrás de uma árvore.
Enquanto eu olhava, com o olho da mente, vi-a correr e saltitar, passando de uma árvore para outra, como um animal, um morcego ou um lobo. Ela estava seguindo alguém.
Era um monge. Ele usava roupas de saco, e seus pés estavam nus, endurecidos e cheios de crostas. Sua barba e tonsura estavam crescidos e mal-aparados.
Ela o observava de trás das árvores. Finalmente ele parou para passar a noite, e começou a fazer um fogo, empilhando gravetos, e quebrando um ninho de torno para usar como acendedor. Ele tinha uma caixinha de metal na bata, e bateu a pedra de acender no aço até as fagulhas iniciarem o fogo. Havia dois ovos no ninho que encontrara, e ele os comeu, crus e sem tempero. Não deve ter sido uma refeição muito satisfatória para um homem tão grande. Ele sentou ali à luz da fogueira, e ela saiu do seu esconderijo. Agachou-se do outro lado do fogo e olhou fixamente para ele. Ele sorriu afetadamente, como se não visse um outro ser humano há muito, e com um gesto chamou-a para perto dele.
Ela se levantou e andou em volta do fogo, parando à distância de um braço. Ele remexeu na roupa até achar uma moeda - uma pequena moeda de cobre ? e jogou-a para ela. Ela pegou-a e assentiu, indo até ele. Ele puxou a corda da cintura, e sua batina ondulou, abrindo-se. Seu corpo era tão peludo quanto o de um urso. Ela o empurrou para trás, no musgo; uma mão crispada, como uma aranha, caminhou pelo emaranhado de pelos, até fechar-se no membro. A outra mão traçou um círculo em volta do mamilo esquerdo. Ele fechou os olhos, e tateou com uma mão enorme sob a saia dela. Ela desceu com a boca para o mamilo que estava acariciando, sua pele suave e branca contra o corpo escurecido dele.
Ela cravou profundamente seus dentes no peito dele. Os olhos dele se abriram, depois se fecharam de novo, e ela bebeu. Ela o derrubou e se alimentou. Enquanto o fazia, um fino líquido enegrecido começou a pingar por entre as suas pernas.
- Você sabe o que está afastando os viajantes de nossa cidade? O que está acontecendo ao povo da floresta? - perguntou o Lorde da Feira.
Eu cobri o espelho com a pele de corça, e disse a ele que cuidaria pessoalmente para que a floresta voltasse a ser segura. Eu tinha que fazê-lo, apesar de isso me aterrorizar. Eu era a rainha. Uma mulher tola teria então ido à floresta e tentado capturar a criatura; mas eu já havia sido tola uma vez, e não tinha vontade nenhuma de sê-lo de novo.
Passei algum tempo com livros antigos, pois eu sabia ler um pouco. Passei algum tempo com as ciganas (que atravessavam nosso país pelas montanhas para o sul, ao invés de passar pela floresta, para o norte e oeste). Eu me preparei, e obtive as coisas de que precisaria, e quando as primeiras neves começaram a cair, eu estava pronta.
Nua, eu fiquei, e sozinha na mais alta torre do palácio, um lugar aberto ao céu. O vento arrepiava meu corpo; minha pele ficou como a do ganso depois de depenado. Eu carregava uma bacia de prata, e uma cesta onde havia colocado uma faca e um alfinete de prata, alguns tenazes, um manto cinzento e três maçãs verdes.
Eu os pus no chão e fiquei ali, despida, na torre, humilde diante do céu da noite e do vento. Se algum homem tivesse me visto parada ali, eu teria atraído seus olhos; mas não havia ninguém para espiar. Nuvens cruzavam o céu, escondendo e descobrindo a lua minguante.
Peguei a faca de prata e fiz um talho no meu braço esquerdo - uma, duas, três vezes. O sangue pingou na bacia, a cor escarlate parecendo negra à luz da lua.
Adicionei o pó do vial que pendia do meu pescoço. Era um pó marrom, feito de ervas secas e da pele de um certa espécie de sapo, além de algumas outras coisas. Ele tornou o sangue mais espesso, impedindo-o de coagular.
Peguei as três maçãs, uma a uma, e furei suas peles suavemente com meu alfinete de prata. Então coloquei as maçãs na bacia de prata, e as deixei lá enquanto os primeiros pequenos flocos de neve do ano caíam lentamente na minha pele, nas maçãs e no sangue.
Quando a luz do amanhecer começou a iluminar o céu, eu me cobri com o manto cinza, e peguei as maçãs, agora vermelhas, na bacia, uma a uma, colocando cada uma na minha cesta com tenazes de prata, tomando cuidado para não tocá-las. Não havia restado nada do meu sangue ou do pó marrom na bacia, a não ser um resíduo negro, como verdete.
Enterrei a bacia no chão. Então joguei um encanto de glamour nas maçãs (como havia feito, anos antes, na ponte, comigo mesma), de modo que elas se tornaram, indubitavelmente, as maçãs mais maravilhosas do mundo; e o brilho carmim de suas cascas era da mesma cor cálida de sangue fresco. Puxei o capuz do meu manto para que cobrisse meu rosto, e levei fitas e lindos adornos de cabelo comigo, colocando-os sobre as maçãs na cesta de junco, e caminhei sozinha pela floresta até chegar ao lugar em que ela morava: um alto penhasco de arenito, entremeado por grandes cavernas que penetravam profundamente nas paredes de pedra.
Havia árvores e pedras redondas ao redor, e eu andei quieta e suavemente de árvore em árvore, sem perturbar um único graveto ou folha caída. Finalmente encontrei um lugar para me esconder, e esperei, e observei.
Depois de algumas horas, um grupo de anões rastejou para fora de uma das cavernas - homenzinhos feios, deformados e cabeludos, os velhos habitantes do país, que são vistos raramente agora.
Eles desapareceram no bosque, e nenhum deles me viu, apesar de um deles ter parado para urinar contra a rocha atrás da qual eu me escondia. Eu esperei. Ninguém mais saiu.
Fui até a entrada da caverna e gritei para dentro: "Olá?", numa voz rachada de velha.
A cicatriz perto do meu polegar latejou e pulsou quando ela veio da escuridão em direção a mim, nua e só. Ela estava com treze anos de idade, minha enteada, e nada maculava a alvura perfeita da sua pele, a não ser a lívida cicatriz do lado esquerdo do seu peito, onde seu coração havia sido arrancado dela há tempos atrás.
O interior das suas coxas estava manchado com uma líquido negro imundo. Ela me olhou atentamente, escondida, como eu no meu manto. Olhava para mim de um modo faminto.
- Fitas, senhora - grasnei - lindas fitas para o seu cabelo...
Ela sorriu e acenou para que eu me aproximasse. Um puxão; a cicatriz na minha mão me puxava para ela. Eu fiz o que tinha planejado, mas fiz mais prontamente do que achava que faria: soltei minha cesta e guinchei como a velha mascate que fingia ser, e corri.
Minha capa cinzenta era da cor da floresta, e eu fui rápida; ela não me pegou. Tomei o caminho de volta ao palácio.
Eu não vi como foi. Todavia, posso imaginá-la retornando, frustrada e faminta, à sua caverna, e encontrando minha cesta caída no chão.
O que ela fez?
Eu gosto de pensar que primeiro ela brincou com as fitas, enrolou-as nos seus cabelos negros, no seu pescoço pálido ou na sua fina cintura. E então, curiosa, tirou o pano que cobria a cesta para ver o que mais havia lá; e viu as maçãs tão vermelhas. Seu aroma era de maçãs frescas, naturalmente; mas também cheiravam a sangue. E ela estava faminta. Eu a imagino pegando uma das maçãs, pressionando-a contra a face, sentindo a fria suavidade contra a pele. E abrindo a boca e mordendo-a profundamente...
Quando cheguei aos meus aposentos no palácio, o coração que pendia da viga do teto, junto com as maçãs, os presuntos e as salsichas, tinha parado de bater. Pendia dali, quieto, sem movimento ou vida, e me senti segura mais uma vez.
Naquele inverno, a neve foi alta e profunda, e começou a derreter tardiamente. Todos nós estávamos famintos quando a primavera chegou. A Feira da Primavera foi um pouco melhor nesse ano. O povo da floresta ainda era pouco, mas estava lá, e haviam viajantes das terras além da floresta. Vi os homenzinhos cabeludos da caverna na floresta comprando e barganhando por pedaços de vidro, e lupas de cristal e de quartzo. Pagavam pelo vidro com moedas de prata - o espólio das depredações da minha enteada, não tenho dúvida. Quando não havia mais o que eles comprarem, o povo da cidade corria às suas casas, voltando com seus cristais da sorte, e, em alguns casos, com pedaços inteiros de vidro.
Eu pensei brevemente em matá-los, mas não o fiz. Enquanto o coração permanecesse pendurado, silencioso, imóvel e frio, na viga do meu quarto, eu estaria segura, e também o povo da floresta, além do povo da cidade. Meu vigésimo-quinto ano veio, e minha enteada tinha comido o fruto envenenado há dois invernos, quando o Príncipe veio ao meu palácio. Ele era alto, muito alto, com frios olhos verdes e a pele morena do povo além das montanhas.
Ele cavalgava com uma pequena comitiva, grande o suficiente para defendê-lo, pequena o suficiente para que outro monarca - eu, no caso - não o encarasse como uma ameaça potencial.
Eu fui prática: pensei na aliança de nossas terras, pensei no Reino se estendendo das florestas até o mar, ao sul; pensei no meu amor louro e barbado, morto há oito anos; e, à noite, fui até o quarto do Príncipe. Eu não sou inocente, embora meu marido anterior, que foi meu rei, tenha sido realmente meu primeiro amante, não importa o que digam. A princípio, o Príncipe pareceu excitado. Ele me fez tirar a roupa e ficar parada em frente à janela aberta, longe do fogo, até minha pele ficar arrepiada e fria como pedra. Então ele pediu que eu me deitasse de costas, com as mão cruzadas sobre meus seios e meus olhos bem abertos - mas fixos nas vigas do teto. Ele me disse para não me mover, e para respirar o mais imperceptivelmente possível. Implorou que eu não dissesse nada. Abriu minhas pernas.
E então entrou em mim.
Quando ele começou a empurrar, senti meus quadris se levantarem, senti-me começar a me encaixar nele, ação por ação, empurrão por empurrão. Gemi. Não pude evitar.
Sua masculinidade escorregou para fora de mim. Eu a busquei e toquei, uma coisa minúscula e escorregadia.
- Por favor - ele disse, suavemente - você não deve se mexer nem falar. Só fique aí nas pedras, tão fria e tão bonita...
Eu tentei, mas ele havia perdido qualquer que fosse a força que o mantinha viril, e, um pouco mais tarde, deixei o quarto do Príncipe, suas maldições e lágrimas ainda ecoando em meus ouvidos.
Ele partiu cedo na manhã seguinte, com todos os seus homens, e eles cavalgaram para dentro da floresta.
Imagino seus quadris agora, enquanto ele cavalgava, um nó de frustração na base da sua masculinidade. Imagino seus lábios pálidos pressionados juntos, tão estreitamente. Então imagino sua pequena tropa cavalgando pela floresta, chegando finalmente ao jazigo de vidro e cristal da minha enteada. Tão pálida. Tão fria. Nua sob o vidro, pouco mais que uma garotinha, e morta. Na minha imaginação, quase posso sentir o repentino enrijecer do membro dele, dentro das calças, e vislumbrar a luxúria que o tomou então, as orações que murmurou sob a respiração, agradecendo sua boa sorte. Eu o imagino negociando com os homenzinhos peludos, oferecendo-lhes ouro e especiarias em troca do adorável cadáver no monte de cristal.
Eles aceitaram o ouro de boa vontade? Ou olharam para aqueles homens em cima dos seus cavalos, com suas espadas afiadas e suas lanças, e perceberam que não tinham alternativa?
Não sei. Eu não estava lá. Não estava espiando. Só posso imaginar...
Mãos, removendo os blocos de vidro e quartzo que cobriam seu corpo frio.
Mãos, gentilmente acariciando seu rosto frio, movendo seu braço frio, regozijando-se de encontrar o corpo ainda fresco e maleável.
Ele a possuiu ali, na frente de todos? Ou carregou-a até um lugar recluso antes de montá-la? Não sei dizer.
Ele removeu o pedaço de maçã da garganta dela? Ou seus olhos se abriram lentamente, enquanto ele estocava dentro do seu corpo? Será que aquela boca se abriu, seus lábios vermelhos se separaram, aqueles dentes amarelos e afiados se fecharam no pescoço dele, enquanto o sangue, que é vida, escorria pela garganta dela abaixo, levando o pedaço de maçã, minha posse, meu veneno?
Eu imagino; não sei.
O que sei é que fui acordada no meio da noite pelo coração dela, batendo e pulsando mais uma vez. Sangue salgado pingou no meu rosto, vindo de cima. Eu me sentei. Minha mão queimava e pulsava como se eu tivesse acertado a base do meu polegar com uma pedra.
Houve uma batida na porta. Tive medo, mas sou uma rainha, e não o demonstrei. Abri a porta.
Primeiro os homens dele entraram em meu aposento e ficaram em volta de mim, com suas espadas afiadas e suas longas lanças. Então ele entrou, e cuspiu no meu rosto.
Finalmente, ela entrou no quarto, como tinha feito logo que me tornei rainha, e ela era uma criança de seis anos. Ela não havia mudado. Não realmente.
Ela puxou o barbante onde o seu coração estava pendurado. Tirou as frutinhas secas, uma a uma; os bulbos de alho, agora ressecados depois de tantos anos.
Então ela pegou o seu pertence, seu coração pulsante - pequeno, não maior do que o de uma cabra ou filhote de urso - enquanto ele pulsava e despejava seu sangue na mão dela.
Suas unhas deviam ser tão afiadas quanto vidro; ela abriu o peito com elas, correndo-as sobre a cicatriz púrpura. Seu peito se escancarou, de repente, aberto e sem sangue. Ela lambeu seu coração uma vez, enquanto o sangue corria pelas suas mãos, e empurrou-o para o fundo do peito.
Eu a vi fazê-lo. Eu a vi fechar a carne do peito mais uma vez. Vi a cicatriz púrpura começar a desaparecer.
Seu príncipe olhou, brevemente constrangido, mas colocou seu braço em volta dela e ficaram lado a lado, esperando.
Ela continuou fria, e a exuberância da morte estava nos seus lábios, mas sua luxúria não foi de modo algum apaziguada.
Eles me disseram que iriam se casar, e que os reinos seriam unidos.
Disseram-me que eu estaria com eles no dia da cerimônia.
Está começando a ficar quente aqui.
Disseram às pessoas coisas ruins sobre mim; um pouco de verdade para dar sabor ao prato, mas misturada com muitas mentiras.
Fui amarrada e presa numa pequena cela de pedra sob o palácio, ficando lá por todo o outono. Hoje eles mandaram me buscar; tiraram-me os farrapos, lavaram-me a sujeira, rasparam-me o cabelo e o púbis, e sujaram minha pele com gordura de ganso.
A neve caía enquanto me carregavam; dois homens em cada braço e em cada perna, completamente exposta, aberta e fria, através da multidão da meia-estação, e me trouxeram para este forno.
Minha enteada ficou lá com o príncipe. Ela me observava na minha indignidade, mas não dizia nada.
Quando me jogaram lá dentro, escarnecendo de mim, vi um floco de neve pousar na sua face branca, e ficar lá sem derreter.
Fecharam a porta do forno atrás de mim. Está esquentando aqui, e lá fora estão cantando, festejando e batendo nos lados do forno.
Ela não ria, zombava ou falava. Não me olhou com desprezo, nem se virou.
Mas olhava para mim, e por um momento me vi refletida em seus olhos.
Não vou gritar. Não vou dar a eles esta satisfação. Terão meu corpo, mas minha alma e minha história são minhas, e vão morrer comigo.
A gordura de ganso começa a derreter e reluzir na minha pele. Eu não devo fazer nenhum som. Não devo mais pensar nisso.
Devo pensar no floco de neve no rosto dela. Penso no seu cabelo negro como carvão, seus lábios vermelhos como sangue, sua pele, branca de neve.
-=-
"Escrever é brincar com espelhos, ilusões, reflexos daquilo que é e daquilo que não é. Escrever é criar algo a partir do que parece ser nada, mas no fundo é tudo aquilo que existe. É magia..."
Melt
Siouxsie and the Banshees
You are the melting men
You are the situation
There is no time to breathe
And yet one single breath
Leads to an insatiable desire
Of suicide...in sex
So many blazing orchids
Burning in your throat
Making you choke
Making you sigh
Sigh in tiny deaths
So Melt!
My lover, melt!
She said melt!
My lover, melt!
You are the melting men
And as you melt
You are beheaded
Handcuffed (in lace and blood and sperm)
Swimming in poison
Gasping in the fragrance
Sweat carves a screenplay
of discipline...and devotion
chorus
Can you see?
See into the back of a long, black car
Pulling away from the funeral of flowers
With my hand between your legs
Melting...
E eu me lembro
quando a gente derretia
nos finais de tarde
antes de sair
para mentir por aí...
O ano era mil novecentos e noventa e passado
e tudo fazia sentido
mesmo quando parecia não fazer.
E é claro que sinto saudades...
"Tire as mãos desta merda de teclado e coloque suas mãos em mim, porra!"
segunda-feira, 28 de junho de 2004
sexta-feira, 25 de junho de 2004
Grendel
a música-fábula do Marillion baseada na antiga história de Beowulf e Grendel, a mais antiga história de cavalaria da língua inglesa.
Midnight sun bids moors farewell, retreats from charging dusk
Mountains echo curfew's bell, signal ending tasks
They place their faith in oaken doors, cower in candlelight
The panic seeps through bloodstained floors as Grendel
stalks the night
Earth-rim walker seeks his meals, prepare the funeral pyres
The shaper's songs no longer heal the fear within their eyes,
Their eyes, their eyes, their eyes, their eyes
Wooden figures, pagan gods stare blindly cross the sea
Appeal for help from ocean fogs, for saviors born of dreams
They know their lives are forfeit now,
priestly heads they bow in shame
They cannot face the trembling crowd that flinch in Grendel's name
Earth-rim walker seeks his meals, prepare the funeral pyres
The shaper's songs no longer heal the fear within their eyes,
Their eyes, their eyes, their eyes, their eyes
As Grendel leaves his mossy home beneath the stagnant air
Along the forest path he roams to Hrothgar's hall so fair
He knows that victory is secured, his charm will testify
His claws will drip with mortal blood as moonbeams haunt the sky
As Grendel leaves his mossy home beneath the stagnant air
Along the forest path he roams to Hrothgar's house so fair
He knows that victory is secured, his charm will testify
His claws will drip with mortal blood as moonbeams haunt the sky
Earth-rim walker seeks his meals, prepare the funeral pyres
The shaper's songs no longer heal the fear within their eyes,
Within their eyes, within their eyes, within their eyes
Silken membranes, span his path, fingerprints in dew
Denizens of twilight lands, humbly beg him through
Mother Nature's bastard child, shunned by leaf and stream
An alien in an alien land seeks solace within dreams
The shaper's lies, his poison tongue maligned with mocking harp
Beguiling queen, her innocence offends his icy heart
Hounds freeze in silence, bewitched by the reptile's spell
Sulphurous essence pervades round the grassy dell
Hero awaits him like lamb to the butcher's knife
Stellular heavens ignore even children's cries
Screams are his music, lightning his guide
Raping the darkness, d- d- d- d- death by his side
Chants rise in terror, pray round the oaken beam
Flickering firelight portraying the grisly scene
Warriors advance, prepare for the nightmare foe
Futile the sacrifices even the hearts must know
Heroes' delusions with feet in the grave
Lurker at the threshold, he cares not for the brave,
he cares not for the brave
So you thought that your bolts and your locks would keep me out
You should have known better after all this time
You're gonna pay in blood for all your viscious slander
With your ugly pale skins and your putrid blue eyes
Why should I feel pity when you kill your own and feel no shame?
God's on my side, sure as hell I'm gonna take no blame,
I'm gonna take no blame, I'm going to take no blame
So you say you believe in all of Mother Nature's laws
You lust for gold with your sharpened knives
Ooh, when your hordes are gathered and your enemies left to rot
You pray with your bloodstained hands at the feet of your pagan gods
And you try to place the killer's blade in my hands
You call for justice, distort the truth
Well I've had enough of all your pretty, pretty speeches
Recieve your punishment expose your throats to my righteous
claws and let the blood flow,
let the blood flow, let the blood flow, let the blood flow, flow,
flow, flow, flow, flow, flow, flow, flow, let the blood flow,
let the blood flow, let the blood flow, let the blood flow,
let the blood flow, flow, let the blood flow, let the blood flow,
let the blood flow, let the blood flow, flow, flow, let the blood
flow, let the blood, let the blood, let the blood, let the blood,
let the blood, let the blood, let the blood, let the blood,
blood flow, flow, flow, flow, flow, flow, flow, flow, flow
Isso tocou o dia inteiro na minha cabeça (e no meu winamp) hoje...
A vida é realmente uma grande viagem, cujas curvas do caminho são por vezes supreendentes. Não há como não se apaixonar por esta tal estrada, este rio, chamado vida.
Só me resta escrever, para homenagear esta beleza.
E agora, ao que parece, escrevo fábulas também.
(até nós mesmos nos supreendemos com o que fazemos quando nos deixamos ir...)
O Cavaleiro e o Dragão (Primeira Parte)
Uma das fábulas internas do Duende.
the DragonRider, Keith Parkinson
"Ele não podia conter sua felicidade (e seu medo) enquanto esperava no topo da colina. Hoje, depois dos aprendizados, depois do sofrimento e das noites em claro e dos estudos. Hoje, depois de tudo, sua vida iria começar de novo de outra forma. Esperando, enjoado pelas bebidas do último ritual, ele esperava pela chegada de seu companheiro para toda a vida. Hoje Amarath iria conhecer o seu dragão. E em meio aos fiapos de nuvens no céu frio da noite, o seu dragão chegou.
Amarath olhava apreensivo para a sua mítica montaria enquanto esta se aproximava. Era um pouco menor do que pensava, e também era mais fino, quase uma serpente com asas e patas. Tinha o corpo tão verde que mesmo na escuridão da noite, iluminada apenas pelas estrelas e pelas fogueiras do dia dos fogos, sua cor era distinguível. Não fazia outro som senão o de seu corpo cortando o ar e tinha os dentes desiguais e pontiagudos à mostra, como estivesse sorrindo para a noite. Amarath apertou com as mãos o galho da árvore onde se segurava enquanto esperava pela vinda dos vômitos e a chegada de sua montaria. Em seu último momento esta espera parecia ainda mais próxima da eternidade.
Amarath empertigou-se, como um guerreiro deve fazer frente aos outros, quando ficou face a face com sua montaria. Gostaria de saber o que dizer, mas apenas conseguiu olhar para aqueles olhos que brilhavam como carvões alaranjados na noite. Sabia que dragões conseguiam falar a língua dos homens quando queriam, mas este parecia estar se divertindo com o silêncio confuso. À volta os outros membros da tribo pareciam muito desinteressados naquele momento que era tão crucial para Amarath. E então Amarath sentiu que ia chorar, não sabia se de emoção ou confusão. O dragão apenas deitou-se no chão, com um ar ligeiramente divertido em seus olhos.
Por fim, tomando coragem, Amarath falou:
- "Eu sou o seu cavaleiro, me chamo Amarath"
O dragão apenas continuou mostrando os dentes, o que deveria ser um sorriso. Sua respiração era ruidosa e quente, cheirava a fogo e cinzas.
- "Devo montar em você agora..." disse Amarath, ainda sem conseguir sair do lugar.
- "E o que está esperando? Que eu monte em você?" disse por fim o dragão.
Amarath ficou envergonhado, mas naquele momento descobriu que quando se trata de dragões, você manda ou é mandado. Ele ainda teria que aprender a mandar. Por hora ele apenas era um menino..."
Esta fábula continua...
UPDATE: Leia a segunda parte da fábula O Cavaleiro e o Dragão
quarta-feira, 23 de junho de 2004
gosto do gosto
uma velha poesia, que de certa forma ainda me descreve.
virou meu "about me" do orkut, para o desespero de meu senso estético... :)
Eu gosto de assimetrismos,
de coisas em seu lugar
e fora deles.
Eu gosto de banhos de chuva
e de pessoas que tomam banhos de chuva.
Eu gosto de coisas naturais
e de coisas bem fabricadas.
Gosto de roupas rústicas
coloridas ou não.
Gosto de pessoas delicadas,
educadas, ou não.
Gosto de sinceridade
e de coisas espontâneas
que fazem os tolos corarem.
Eu gosto de pele,
de toque, de afago
e de ter espaço
e de partilhá-lo.
Eu gosto de andar e ver gente
e por vezes gosto de ficar parado
e não ver ninguém
exceto quem
eu quero ver.
Eu gosto de comida apimentada
e do suor do dorso de quem desejo.
Eu gosto de manusear objetos
e tocar o que é macio de se tocar
o que é liso, o que é rugoso
o que é gostoso
e o que é de se ter.
Eu gosto do que se tem para fazer
e por vezes eu simplesmente
não gosto de fazer
o que querem que eu faça.
Eu gosto de descobrir a nudez
e de cobrir o que tem frio
e proteger o que é frágil.
Eu gosto de sucos bem doces
e de muitos copos de água
depois de uma cervejada.
Eu gosto de alças que caem
e de cabelos que o vento leva.
Gosto de pessoas que dançam
mesmo sem música
e de pessoas que tem a própria música
batendo no peito.
Eu gosto, sobretudo de quem tem peito
e de quem sabe ter peito
para não se dobrar
aos que só tem covardia.
Eu gosto dos meus cigarros
e eu entendo quem não gosta deles.
Eu tenho meus vícios,
minhas fixações, meu erros.
Gosto de gostar de mim
e de quem gosta
de gostar de mim
por que gosta do gosto
que eu tenho
quando estou assim
perto.
Eu gosto quando coçam as minhas costas
e quando leem minhas poesias
mesmo as mais longas
mesmo as mais sinceras.
Eu gosto de quem gosta do que faço
do que digo
do que sou.
Eu gosto quando concordam comigo
mas só um pouco
para que não pareça
apenas uma repetição
do que sou. (eu tenho espelho para isso)
Gosto de vestir roupas estranhas
por que elas são como eu sou.
Gosto de fazer o que quero, quando quero
e aceito que isso seja difícil
e caro de ser feito.
Eu gosto quando a vida sorrí
e quando ela chora,
eu choro. Eu gosto de chorar.
E gosto quando me pegam no colo
para me deixar chorar.
Gosto de pessoas que sejam livres
para tirar e por
para ficar ou ir embora.
Gosto de campeonatos de cuspe a distância
e coisas toscas que pessoas sensiveis
não gostam de comentar.
Eu gosto de pores do sol
quando tenho paciência
e tempo para ver pores do sol.
Eu gosto de dormir antes, depois ou durante
o nascer do sol
mas não gosto de dormir sozinho.
Eu gosto de tem quem cheiro
de quem tem gosto
de quem tem rosto
e coração.
Gosto de quem passa a mão,
de quem sente,
de quem diz
o que sente
e quando a pele rala o dente
sabe ser tesão.
Eu gosto de ouvir musica alta
e de ouvir o silêncio.
Eu gosto de falar muito,
emendar um assunto no outro
ou ficar calado e nem sequer responder
quando me chamam.
Eu gosto de me sentar parado
e de pular de um lado para outro
imitando algum animal.
Gosto de coisas ridículas,
patéticas, sem sentido...
E gosto de encontrar um sentido
para tudo que não tem sentido
e de brincar com o sentido
das coisas,
mas nunca com o sentimento
das pessoas.
Eu gosto do que é belo
por que sou humano.
Eu vejo a beleza das coisas
por que a beleza está
nos olhos de quem a vê.
Eu não gosto do que é feio
e do que é feito
para ser feio. Mas eu gosto
de coisas estranhas
que causam ânsia e pavor
por que me trazem
o novo, vigoroso, aos olhos.
Eu gosto de tatuagens, piercings,
cores e enfeites. Gosto do excesso
por que a falta é apenas ausência...
Eu gosto de palavras
e gosto das coisas
que são maiores do que as palavras.
Eu gosto de mim
e eu gozo de mim
e eu gosto
de quem gosta de mim.
Eu gosto...
Você gosta?
Então vem ver se eu estou afim.
É hoje!
Ao longo da tarde de hoje vai acontecer a ultrapassagem do Brasil sobre os EUA no número de usuários do Orkut
PARA PARA PARA!
Corta a musiquinha de "tatatã tatatã... Ayrton Senna do Brasiiiiil" porque isso é muito brega!
Aconteceu nos servidores de bate-papo (IRC), aconteceu no fotolog.net, e agora acontece no Orkut.
O que será que nós, brasileiros, temos para tomar conta assim tão rápido dessas manias de Internet?
Será que vamos ganhar alguma regalia extra, como detalhamento do estado de residência dos usuários brasileiros ou coisa assim?
Ficam as perguntas. Alguém tem alguma resposta?
UPDATE:
Ei, vocês viram o Irã também como tá foda? Com seu inimigo ancestral destruído pelo Tio Sam e os preços do petróleo quase trombando na ISS (Estação Espacial Internacional, para quem não vive no mundo da lua e portanto não sabe) de tão altos, já era de se esperar que o Irã experimentasse uma revolução cultural (e portanto uma revolução digital também). Daqui a pouco as iranianas vão estar mostrando seus seios muçulmanos também no Yafro, para o desespero (e secreta felicidade) do Ayatolá da vez :)
Vou seguir o exemplo do meu irmão e fazer umas amizades iranianas no Orkut, ler um pouco a respeito desse momento deles, e depois quem sabe eu não escreva um post a respeito?
UPDATE 2:
O Mário Persona achou meu post bonitinho e me linkou lá no blog dele. Enquanto isso o Brasil já ultrapassou os EUA e eu já tive uma noite excelente, e, bem... o resto não interessa. :)
A noite cai sobre a cidade seca. Ainda entretido entre as gentes, o jovem bardo vê no pôr do sol o chamado à batalha. Ele respira fundo, sai silenciosamente sem se despedir e ruma para casa. Ele vai vestir suas armaduras e preparar as suas armas. Ele vai se preparar para subir a colina e então vai lutar e festejar junto a seus novos irmãos em armas. Agora seu brasão é polido e ele tem uma bandeira sob a qual lutar. Esta noite mais uma vez os Deuses vão ouvir a sua canção, e ele estará como sempre à mercê de seus divinos desígnios. Ele caminha em silêncio, mas com um sorriso nos lábios...
Cai a noite na cidade seca
e o bardo não vai fugir à luta...
terça-feira, 22 de junho de 2004
Os Portôes de Zipper
(modelo e fotografia: Rafaelle Viana / texto: Daniel Duende)
Entrou em seu quarto e se olhou no espelho. Isolou-se do mundo além das portas e janelas para pensar, e talvez descansar, mas mesmo assim precisava encontrar um olhar. O seu olhar. Aquele que ninguém mais conseguia realmente fitar. Não sabia se estava quente ou se estava frio, pois estava consciente apenas da própria temperatura. Da própria solidão fria e do caldeirão de amor que se derramava sem propósito. Sem outro motivo, seu corpo fervia, e por trás daqueles portões de zipper gritava o coração da princesa em seu castelo.
No silêncio de seu quarto ela pensava:
será que alguém está chegando, e quando?
O caminho para seu coração estava por trás daqueles portões de zipper, além das palavras, através de seu corpo e dos campos inexplorados de sua alma. Será que alguém atravessaria aquela estrada? Ela não sabia o que esperar, e por pouco não se desesperava. Nos mais profundos sentidos da palavra ela precisava dar, para não transbordar. Os respingos de amor do caldeirão em seu coração queimavam sua carne e ela não sabia o que pensar, então apenas sentia.
Será que alguém está chegando?
E como, e quando?
No espelho ela só encontrou o seu olhar e a única lágrima que ela também chorava.
Lá fora, apenas um bater de asas no silêncio da noite...
segunda-feira, 21 de junho de 2004
"Fogo é o encontro da matéria com o oxigênio. Se a gente tem isso sempre na cabeça, qualquer chama pode ser vista como uma reunião, uma ocasião para um prazer químico. Fumar um cigarro é terminar com uma longa separação; incendiar uma delegacia de polícia é festejar a volta ao lar de milhões de moléculas"
Tom Robbins em Even the cowgirls get the blues
(um livro dedicado às amebas, o único ser imortal da terra)
Meu professor... :)
A nudez dos corpos
(post originalmente escrito na sexta feira passada, às 17:20)
"Excess sadness laughs. Excess joy weeps.
The lust of the goat is God's generosity
The nakedness of women is the work of God"
William Blake, The Marriage of Heaven and Hell
A nudez dá medo à maioria de nós. Com nossas educações ainda tão tradicionais, em um mundo que muda tanto para permanecer igual, não sabemos ficar nus e expostos. Quantos de nós nunca tiveram pesadelos, nos anos de escola, em que nos víamos indo inadvertidamente nus para a escola? O que acontecia então nestes pesadelos? As pessoas riam, apontavam... ou elas apenas olhavam?
Porquê temos tanto medo de nossa própria nudez, para não dizer da nudez alheia também? Será uma dificuldade de dissociar a visão do corpo do ato sexual (e uma concomitante dificuldade de lidar com o próprio ato sexual)? Desde pequenos somos ensinados (ao menos eu fui) que devemos andar vestidos, não devemos olhar por fechaduras ou através de janelas enquanto os outros trocam suas roupas, não devemos declarar públicamente que preferíamos que nossa interlocutora estivesse nua. Mostrar seu corpo é um sinal de entrega ou desrespeito (já pagaram um bunda lelê pra você? é pior do que dar dedo...) ou desleixo, calculado ou não (olha lá o decote daquela mulher, será que ela não sacou que dá pra ver tudo?). Onde fomos parar, tão rápidos em nos vestir, lentos em nos despir e ansiosos pela nudez alheia?
William Blake dizia que "os bordéis são construídos com os tijolos da religião", e tinha bons motivos para afirmar isso. Nada torna tão necessária a profissão de puta quanto nossa sociedade tão preocupada com o que pode e ou não ser feito dentro ou fora de quatro paredes. Já consigo ouvir as vozes daqueles que dirão que "mas hoje em dia tudo virou uma putaria. é ridículo se falar em moralismo nestes tempos imorais". Grande merda dizem estas vozes. A "putaria" que se seguiu à revolução sexual dos anos sessenta é uma coisa extremamente moralista. Você precisa ter uma regra antes de quebrá-la, e nada pode causar maiores desastres do que as regras absurdas. Uma vez que recebemos frequentemente educações absurdas a respeito da nudez e do sexo, é impossível não quebrar as regras. E uma vez que você quebra as regras, ah, meu nego, você já fodeu com tudo e não tem volta.
Ouvi dizer que Adão e Eva andavam nus no paraíso. Ele, de boa, com seu bigulim balançando molenga entre as pernas sem se preocupar muito com o uso que daria para ele além de não molhar os joelhos ao mijar (não me admira que não tivessem filhos). Ela, feliz da vida, com sua xaninha arejada e livre de absorventes (estes sim que tornam as menstruações em pastas fedorentas de sangue podre, como me reafirmou uma bruxa querida) e roupas apertadas. Como devem glorificar os fabricantes de tecidos e revistas de mulher pelada esta tal maçã do conhecimento. O que seria a maçã do conhecimento? O que ela "ensinou" a nossos ancestrais proto-naturistas que fez com que tivessem tanta vergonha de suas "vergonhas"? Diz a bíblia (sim, eu conheço bem a bíblia) que ao comer a maçã, oferecida por aquela serpente que seria a primeira manifestação de satanás, nossos queridos Adão e Eva tomaram consciência de que estavam nus e que isso era feio. Agora, cá entre nós, se isso era feio, que mal gosto tinha o criador em não ter avisado isso para eles antes, não? Isso me cheira a uma reiterpretação mítica (que os intelectuais, do tipo que eu não sou, chamam de Midrash) da bíblia feita por aqueles monges sacaninhas da idade média. E assim chegamos ao ponto: A igreja.
Na Roma de Diocleciano (o tal imperador romano que, ao perceber que Roma estava, com o perdão do termo, na merda, resolveu adotar a religião da moda como religião oficial da quebrada, reinventando a "virada de casaca".), até onde me informam meus conhecimentos de história clássica, era moda ainda entre as mulheres usar suas togas pendendo apenas sobre um ombro, mantendo um seio exposto. Não que elas estivessem preocupadas de expor os dois, ou mesmo qualquer outra parte de seus corpos. Elas apenas achavam legal usar a roupa assim, era moda (e quem entende a moda?). Não era por isso que não podiam ser consideradas devotas, no entanto. A "moda" de dizer que a nudez era infernal (e que as mulheres carregavam o portão do inferno entre as pernas) surgiu alguns muitos anos depois. Talvez por que os homens, para variar, tem medo das mulheres e precisavam dar um jeito de injetar na filosofia popular a idéia de que as mulheres eram mesmo muito fodas e os homens muito bobos e que no fim as mulheres é que mandavam. E então, por medo da superioridade feminina, resolveram tomar medidas para diminuir ao máximo o poder das gostosas espertas romanas (e do resto do império cristão). Não adiantou muito. Você sempre pode tirar a roupa, entre quatro paredes ou não, e os portôes do inferno continuavam se abrindo, graças ao Bom Deus, para todos aqueles para quem já se abriam antes. A única diferença é que agora era feio se falar sobre o assunto, se mostrar publicamente o ato e se admitir que se gostava muito destas coisas. E assim a igreja católica apostólica romana inventou a putaria sobre a matéria prima que era apenas o desejo humano saudável (afinal todos sabemos que depressão da libido é uma desordem ligada ao estresse ou problemas psíquicos).
Depois deste agradável passeio pela história da putaria e hipocrisia romana, voltamos ao seio (oba) da questão. Por que é que hoje em dia, mesmo não sendo assim mais tão carolas, continuamos com toda esta distorção e este medo de nossos corpos e de nosso sexo? Medo é o caralho, diz a mesma vozinha que eu estava ouvindo antes. É, desta vez ela tem razão. Medo é o caralho. O medo é do caralho mesmo. É o medo que as mulheres são inspiradas a ter (e graças, novamente, ao Bom Deus e à Boa Deusa nem sempre aprendem) dos apetites masculinos e o enorme medo que os homens, estes portadores de, *ahem*, caralho, tem do poder que as mulheres podem ter sobre eles. A nudez, que já não é mais um tabu, continua sendo algo desconfortável para a maioria. Desconfio que isso seja, como disse, mais do que hábito. Talvez seja puro medo de se mostrar, seja no sentido literal ou simbólico. Somos todos uns mascarados com nossas roupas, nossos silêncios, nossas revistas de mulher pelada e nossas olhadas de lado, nossas lunetas, nossas palavras pouco agradáveis para as mulheres de bundas arredondadas e decotes generosos e nosso enorme medo de não sermos desejáveis o bastante por debaixo de nossas roupas.
Eu gosto do que é belo, e eu, a meu modo, sou um homem muito religioso. Minha adoração pela criação divina me leva a amar o céu da minha cidade, as árvores, os pássaros, os animais, os universos que existem dentro das pessoas, e a beleza de seus corpos. Sim, por que é tão diferente assim dizer "nossa, você tem lindos olhos" e dizer "puxa, seus seios são lindos"? Está na hora de ser mais sincero, despir-se um pouco de séculos de merda, e começar a pensar na sua relação com sua nudez. Eu gosto da beleza e da nudez, assim como você, e estou ficando cansado de ser considerado esquisito por causa disso. Voyeur e escoptófilo? Não. Eu sou humano, e você?
De manhã, botas e facas.
(post originalmente escrito na sexta feira, às 15:30)
Acordei com o sol batendo em minha cara, como um irmão mais velho ou um pai que acorda um filho de um jeito irritante mas eficiente. Já deviam ser quase oito horas da manhã e as pessoas já deviam estar olhando torto para um homem esquisito dormindo feliz em seu carro dentro de um condomínio fechado. Povinho limitado...
Comprei coturnos novos. Estou impressionado como são confortáveis os novos modelos para oficiais dos coturnos Arroyo. Espero que tenham solados mais duráveis e costuras mais resistentes também. A vendedora, simpática e feia como se tivesse bócio (mas não tinha) me permitiu pagar em três vezes pelos coturnos e pelo punhal.
Sim, eu comprei um punhal. Eu gosto de lâminas. Quando era mais jovem andava com uma faca grande (com bainha e couro fedorento de bode) dentro do carro e um eficiente tramontina de arremesso escondido sob a blusa. Meu novo punhal é pouco gracioso. É bruto e eficiente, feito de uma peça única de ferro pintado a fogo com cabo de corda. São os melhores para magia.
Sentado em meu trono fico namorando o punhal sobre a bancada , em espiadelas, enquanto me delicio com o segundo livro de Tom Robbins (que está me ensinando a escrever em longas aulas particulares através do tempo). Tenho um pensamento estúpido e gosto dele. Todo homem deveria andar com um punhal na cintura. Se por nenhum outro motivo porque um punhal é um objeto viril e inútil nesta sociedade tão não violenta. Será? Acho que não.
Uma vozinha sobre meu ombro, talvez uma farpa de meu superego contruída por todas as pessoas medíocres que conheci, me diz que sou muito estranho e assustador. Estranho e assustador para as pessoas que se escondem sob o manto da pretensa normalidade, sim. Mas não mais estranho e assustador quanto qualquer outra pessoa. As pessoas são maravilhosas e temíveis. Mais temíveis ainda quando fingem ser normais. Sempre achei que o comedimento e o silêncio eram confissões mudas de culpas inimagináveis. Ao menos eu estou à mostra, e todos podem ver o que sou. Ponto para mim.
FINALMENTE!
Finalmente a Internet aqui de casa passou a funcionar direito. Agora todos os computadores da casa tem internet o tempo todo...
Enfim, agora eu posso acessar quando quiser, colocar minha internet-radio no ar e etc etc etc...
Seguem os posts que escrevi na sexta feira de tarde mas não tive chance de postar.
P.S. Para quem ainda não leu o meu conto Tabu, basta clicar aqui
quarta-feira, 16 de junho de 2004
A tribo festeja após o festival, ensaia danças para a próxima festa, pessoas se abraçam e pessoas se felicitam e pessoas seguem seu caminho. Alimento o Dragão sentado à beira da fogueira, recuso comida, passeio entre irmãos em armas...
Esta é uma foto de minha vida, vertida em palavras.
Entre as muitas coisas que aprendi
e prefiro guardar para mim
não posso deixar de dizer
que uma pamonha por dia
faz um homem feliz...
Junius XVI, MMIV A.D.
antes do amanhecer do dia...
- Como vai a vida?
- A vida segue seu rumo. O trabalho segue, o livro caminha para o seu final, eu vou aprendendo e vou me fascinando com a estrada. Assim eu vou vivendo.
- (...) e então? O que vai ser?
- Eu vou continuar fazendo o mesmo que fazia ontem. Vou escrever, vou ler, vou viver e me maravilhar com a vida, e estar aberto para o que vier.
- Mas e se (...)?
- Eu estarei lá.
- Você não tem medo? Não tem medo do que pode acontecer?
- Eu tenho medo e eu tenho amor, e eu tenho uma vida boa e amigos de verdade. Todas estas coisas são reais.
- Então vai ser?
- Vai ser o que Deus quiser. Eu estou aqui. É tudo.
Fragmentos de um diálogo interno...
Abriu os olhos e ofuscou-se com o teto branco iluminado pelo sol. Sua boca amarga de acordar ainda guardava no fundo um sabor que remetia às boas lembranças da noite que passou. Olhou para os lados, reconhecendo onde estava, tentando rememorar a noite passada, e acreditar. A seu lado ressonava Elisa, com seu corpo miúdo e seios brancos ao sol cobertos parcialmente pelos cabelos negros. Não sabia o que sentir, mas não sabia se já sentira-se tão feliz. Uma felicidade que queria desfrutar pois sabia que tudo seria muito complicado dali em diante. Virou-se na cama e passou delicadamente sua mão sobre o ventre de Elisa até chegar aos pêlos macios de seu sexo, e então ali descansou. Cumprira na noite anterior um desejo secreto e agora aceitaria as conseqüências. O delicioso desejo que destrói os homens e as mulheres...
Talvez até gozasse de novo.
Vamos voltar aos dias anteriores, para que tudo faça mais sentido.
Thiago chega ao bar, como sempre, de mãos dadas a Mariana. Às vezes é difícil acreditar no contraste que há entre eles. Mariana tem a pele ligeiramente morena e olhos negros intensos. Suas sobrancelhas grossas sobre o rosto de boneca são emolduradas por seus cabelos negros e lisos de corte reto. Mariana usa roupas muito coloridas e adereços neon, piercings neon; é uma menina com um brilho próprio que parece se apagar aos poucos. Thiago tem os cabelos loiros e curtos e um rosto fino de onde fitam olhos muito azuis; seu sorriso constante de senhor da situação seduz ou irrita, dependendo do gosto de quem o vê. Usa uma jaqueta de couro com ombros largos sobre as roupas da moda que veste e anda sempre ereto. Thiago é tão irritantemente principesco quanto é vilanesco. Olha nos olhos de todos com quem fala como quem não tem nada a temer. É claro que ele sorri ao entrar no bar; seu andar é seguro. Mariana sorri ao aproximar-se da mesa, cumprimenta Felipe, Bárbara e Elisa e senta-se. Thiago permanece de pé com a mão postada sobre o ombro de Mariana enquanto cumprimenta os amigos, os garçons, acena à distância para os conhecidos em outras mesas, como um rei chegando a um banquete.
Elisa é irmã de Felipe, que namora com Bárbara. Tem os cabelos negros e longos formando uma cachoeira sobre os ombros brancos. Seus olhos são de um castanho muito claro enquanto os de seu irmão são de um azul turvo. Seu corpo pequeno quase não cabe em suas calças jeans de felicidade por ser tão perfeito. Tanto ela quanto o irmão sorriem. Bárbara lança um ariano olhar de desagrado para Thiago e sorri para Mariana. É fácil gostar de Mariana quando se começa a conhecê-la. Bárbara detesta Thiago mesmo não o conhecendo.
A noite é muito divertida, para Thiago. Ele está feliz pela namorada que tem, pelos amigos que acha que tem, pela sua popularidade e pelo simples fato de existir. Bem, na verdade apenas os três primeiros motivos sejam verdadeiros. Bárbara não consegue entender o que Mariana está fazendo alí, com Thiago, recebendo tão pouca atenção. Eu acho que eu também não entenderia, se não soubesse que era apenas solidão.
Ao final da noite, despedem-se. Thiago leva Mariana pela mão, principesco como chegara, rumo a seu carro tão querido. Felipe e Bárbara seguem suas vidas, ainda um pouco abalados pela tentativa de suicídio de um amigo. Elisa permanece sentada, com um leve sorriso no rosto. Algumas horas, pessoas e cervejas passam pela mesa de Elisa então. Não muitas, de fato, antes que Thiago apareça novamente no bar, sozinho, e a conduza com o mesmo ar triunfante até o seu carro tão querido. Mariana agora está em casa, dormindo ou não conseguindo dormir. Isso não importa tanto assim para eles.
O carro (tão querido) está parado sob um bloco qualquer da Asa Sul. Não importa qual, nem onde, pois o que importa é que está escuro o bastante para que possam foder bem escondidos. Abaixo das janelas que dormem, dos moradores que talvez durmam, dos blocos solitários na escuridão, Thiago triunfa duas ou três vezes com a anuência deliciada de Elisa. Esta é a vida de Thiago hoje. Muito mais ter do que ser, muito mais parecer do que ser. É foda.
Esta noite, e esta história até agora, não é muito diferente daquelas que se repetem depois desta, e daquelas que aconteciam antes. Thiago com suas duas, ou mais, mulheres. Elisa prendendo em sua teia mais um homem que fode bem, o que é uma boa coisa para e ter por perto. No fundo ela gosta mesmo é de mulheres. Mulheres que sejam fortes e frágeis e que entendam isso. Então neste ponto o acordo entre ela e Thiago é perfeito: mulheres são ótimas, uma boa foda é sempre bom. Enquanto isso Mariana dorme, ou não.
Felipe já estava dormindo, talvez sonhasse, quando o telefone tocou. O sono relutava em largar seu corpo, mas por fim foi vencido por tempo o bastante para que Felipe levasse o celular até o ouvido e murmurasse algo semelhante a um "Alô". Mariana chorava do outro lado da linha. Felipe despertou com o som, tentando encontrar algo melhor a dizer enquanto desfiava lugares comuns ao telefone, daqueles que se diz quando alguém começa a chorar na sua frente. Mariana, entre um soluço e outro, com a voz mais baixa do que nunca, rasgada por soluços, perguntava se era verdade. Felipe tentava ganhar tempo perguntando do que ela falava. No fundo ele sabia, há dias ele já sabia das noites (e algumas tardes) de Thiago com sua irmã, e isso também doía em seu coração esteticamente sensível à dor alheia. Mariana havia acordado, e pelo ruído de alguém pegando a extensão da linha em outro quarto, Elisa também.
Três dias antes Felipe e Thiago tomavam uma cerveja no postinho da Universidade de Brasília. Eram raros os momentos em que as janelas em suas agendas se encontravam, e naquele momento brindavam à vida. Felipe geralmente preferia manter os olhos fechados aos problemas e atos alheios, mas neste dia, ao saber da história de Thiago com sua irmã, resolveu falar. Thiago, com um sorriso absurdamente safado, apenas escutava. "Thiagão, você está acostumado a vencer, mas a vida às vezes nos surpreende, cara. A gente tem que esperar da vida mesmo aquilo que é mais absolutamente inesperado. Eu sei que você está se achando muito foda, mas foda é isso que você está fazendo com a Mári.". Thiago apenas sorria, dizendo entredentes "Exatamente véi. É foda.". Ele mal sabia o que a vida tinha reservado para partir este sorriso guloso.
Elisa quase interrompeu a sexta entoação chorosa da pergunta de Mariana ao telefone ao dizer "É verdade, minha linda". As três vozes fizeram um silêncio que parecia ser feito de cacos pontiagudos de ilusões e ter durado semanas ou meses. Os soluços sem palavras de Mariana de seu lado da linha interromperam este silêncio, finalmente. Felipe não sabia o que dizer, e apenas ficou calado. Elisa continuou ronronando ao telefone, dizendo a Mariana que precisavam se encontrar; só elas duas. Felipe apenas desligou o telefone respeitosamente depois de servir de audiência para o acerto de tão absurdo encontro. Ao deitar a cabeça no travesseiro lembrou-se das palavras que dissera a Thiago, sorriu levemente pela dimensão da ironia da situação e tentou voltar a seus sonhos. Mariana não dormiu, entre os fragmentos irrecuperáveis de seu aparelho telefonônico e de suas ilusões.
O Beirute estava vazio assim como os olhos de Mariana. Ela não costumava fumar, mas aceitou os cigarros e as palavras de Elisa. Esta dizia que a princípio não conhecia Mariana, que a princípio estava tudo bem assim, mas que conforme a conhecera começara a achar tudo aquilo uma grande sacanagem. Bem, sacanagem foi desde o princípio a palavra mais adequada para aquilo, mas ninguém fez este comentário ali. Entre lágrimas que apostavam corrida em suas faces, Mariana não sabia o que dizer e nem o que fazer. Começara a relação com o disputado Thiago logo após terminar dolorosamente com Rodrigo, talvez fosse por solidão, como eu disse, mas gostava de acreditar que estava por ele apaixonada. A dor que sentia neste momento não necessitava de absolutamente nenhum esforço de crença. Ela estava sofrendo de novo. Elisa pagou a conta e conduziu Mariana até seu carro de dali para outro lugar. Afinal, esta era a 109. Esta era a noite.
Já estavam na segunda garrafa de vinho e já haviam pedido o segundo maço de cigarros. Sentadas em duas cadeiras do mesmo lado da mesa, ligeiramente bêbadas, Elisa e Mariana conversavam agora em outro tom. Por uma noite o vinho lavara do peito de Mariana as suas dores, e agora ela conversava, quase confidenciava, com Elisa. Sabia das preferências da linda irmã de Felipe e deixara escapar sua curiosidade em também experimentar. Deixara escapar também um ou dois elogios sobre a beleza e natureza encantadora de Elisa, e ouvira alguns elogios também, que aqueceram seu coração ainda mais que o vinho. Por fim se beijaram longa e delicadamente enquanto a garçonete deixava discretamente o segundo maço de cigarros sobre a mesa. Nas outras mesas do território protegido do Cat's Café ninguém se impressionou com as duas jovens que se beijavam. De fato cenas muito parecidas, talvez sem a mesma ternura, aconteciam em outras mesas naquele exato momento. Ali, deixando para trás o desamor e o tabu, Mariana havia encontrado alguma justiça e alívio para seu coração.
E agora sim...
Mariana abriu os olhos e ofuscou-se com o teto branco iluminado pelo sol. Sua boca amarga de acordar ainda guardava no fundo um sabor que remetia às boas lembranças da noite que passou. Olhou para os lados, reconhecendo onde estava, tentando rememorar a noite passada, e acreditar. A seu lado ressonava Elisa, com seu corpo miúdo e seios brancos ao sol cobertos parcialmente pelos cabelos negros. Não sabia o que sentir, mas não sabia se já sentira-se tão feliz. Uma felicidade que queria desfrutar pois sabia que tudo seria muito complicado dali em diante. Virou-se na cama e passou delicadamente sua mão sobre o ventre de Elisa até chegar aos pêlos macios de seu sexo, e então ali descansou. Cumprira na noite anterior um desejo secreto e agora aceitaria as conseqüências. O delicioso desejo que destrói os homens e as mulheres...
Talvez até gozasse de novo.
Felipe sabia o que acontecera naquele quarto. Nunca antes Elisa havia trazido uma mulher para casa, mas ele sabia muito bem o que acontecera depois que elas chegaram. De qualquer forma não queria estar ali quando elas saíssem do quarto. Queria deixá-las sozinhas, e também queria estar longe dali para não ter que se envolver com a situação. Fechou a porta silenciosamente ao sair, de casa e desta parte da história, rumo à casa de Bárbara.
Elisa e Mariana riam e brincavam na cozinha. Há muito tempo Mariana não sentia-se tão leve. Até mesmo um café da manhã tardio era divertido junto a Elisa, e Mariana sabia que podia se apaixonar. Sabia que podia se apaixonar por aquela mulher. Não podia tirar os olhos dela enquanto discutiam, entre torradas com manteiga ou geléia e copos enormes da vitamina que haviam inventado, sobre o que fariam agora a respeito da improvável figura responsável por aquela improvável união. Em meio aos raios de sol que pareciam sorrir pelos cobogós da cozinha discutiam divertidamente o destino de Thiago, o que acabava decidindo nas entrelinhas o destino delas mesmas. Quando Elisa deixou Mariana na entrada de sua quadra, beijaram-se com a paixão de quem sela uma promessa de amante. Mariana flutuava sobre o chão quando chegou em casa. Não sentia-se mais, de forma alguma, sozinha.
O sorriso de Thiago era o mesmo enquanto esperava, sentado ao lado de Mariana em uma mesa do Estação 109, pela chegada de Felipe, Bárbara e Elisa. O rosto de Mariana sim havia mudado. Havia nele um sorriso enigmático e seus olhos tinham novamente aquela força. Talvez Thiago tenha percebido, mas preferiu se ocupar de olhar para si mesmo, como de costume, refletido em todos os seus inumeráveis conhecidos que flanavam pelo bar. Elisa despontou na pequena escada que separa o bar da calçada e sorria para mesa durante todo o percurso. Thiago retribuiu o sorriso com sua habitual face de prazer por ser quem é. Mariana apenas retribuiu o sorriso.
- "O Felipe foi com a Bárbara para outro lugar" disse Elisa enquanto sentava-se de frente para o casal na pequena mesa quadrada.
- "Tá de boa" disse Thiago. "Então somos só nós hoje."
- "Exatamente", sorriu Elisa. Mariana apenas sorriu.
- "A 'nove' tá meio vazia hoje..." disse, casualmente, Thiago enquanto Elisa e Mariana continuavam sorrindo uma para a outra, olhos nos olhos, na assinatura de sua conspiração.
- "A sua... namorada... é maravilhosa, Thiago..." disse, pausadamente, Elisa.
Silêncio. Thiago esconde a perplexidade por detrás do sorriso que desbota.
- "Acho que você nem sabe o quanto" diz por fim, Thiago, em um elogio quase ensaiado, mais para se gabar do que para elevar Mariana.
- "Sim eu sei." Elisa responde no mesmo tom pausado, enquanto estende sua mão para segurar a de Mariana. As duas mãos se encontram logo acima do gargalo da garrafa de Bohemia. Mariana se levanta e senta-se ao lado de Elisa, ainda segurando sua mão, com o sorriso mais enigmático que Thiago já vira em seu rosto. Elisa passa a mão pelo ombro de Mariana enquanto esta se ajeita na cadeira e as duas, cúmplices, deliciam-se com o efeito causado pelo início de seu ato ensaiado. Thiago iria dizer alguma coisa, mas Mariana o calou:
- "A sua... ex namorada também sabe o quanto a sua ex amante é maravilhosa."
O sorriso de Thiago, que já se desmanchara, dá lugar a um queixo caído sob uma boca por onde parecia escorrer o orgulho de toda uma vida, todo ao mesmo tempo.
- "Vem cá" sussurrou Elisa para Mariana, ainda alto o bastante para que Thiago pudesse ouvir.
Agora faltava o golpe final. Beijaram-se com toda a paixão que puderam, e ainda com mais alguma trazida pelo momento de triunfo. O bar, com o olhar chocado de Thiago e as pessoas olhando nas outras mesas e o cara apontando impressionado por trás do balcão parecia ter sido congelado por um instante, como se aquelas bocas, aquelas línguas, tivessem dentro de si o tempo e todo o resto do mundo e o dividissem naquele momento. Quando finalmente o beijo terminou, com um epílogo de dois selinhos leves e estalados, voltaram a fitar sorridentes e róseas um Thiago que parecia ter esquecido que tinha um rosto, tamanha a sua confusão. E então, para despertar o príncipe derrotado, Elisa apenas precisou retirar a espada que haviam cravado com arte e tesão em seu orgulho:
- "Vai embora Thiago, já basta o bar inteiro segurando vela aqui."
O príncipe bateu em retirada. O golpe havia sido tão forte que todo o orgulho e mesmo toda a covardia que poderiam levá-lo a tentar qualquer coisa estúpida contra as duas havia sido sangrado, ao menos naquela noite. Tudo que restava-lhe agora era o seu carro querido, que certamente o levaria para casa.
Quem um dia irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração...
... mesmo que seja uma vingança, ou se permitir fazer o que quer que seja.
Da traição à vingança o caminho é uma estrada muito velha e conhecida. Quando você faz alguém sofrer, não parece compreensível que também sofra em algum momento? Talvez a vingança seja um tabu tão grande quanto a traição, tão grande quanto o tesão e carinho de Mariana e Elisa. Mas nossa vida é mesmo cheia de tabus, e nenhum deles importa agora, talvez. Ao menos alguma coisa boa havia acontecido ali. Ao menos nesta noite, e ao longo de mais alguns dias e noites, Mariana sentira-se feliz. Já Elisa, que sempre se divertia a qualquer custo, estava apenas rindo mais uma vez no final da história. Este seria todo o problema depois, mas isto fica para depois. Em uma noite como aquela o tabu é falar sobre o depois.
Esta é uma história brasiliense
escrita com amor
Escrever é minha redenção e meu ofício.
O que acharam?
terça-feira, 15 de junho de 2004
Whatever Project
Dia: 17 / Junho - Quinta-Feira
Local: Space Bar (410 Sul)
Horário: 22:00h
Ingressos: R$ 5,00
Dj’s: Orpheus, Tworems e Dany Boy
80’s, New Wave, Synth Pop, Indie, Rock’n’Roll, Industrial, Rock Nacional
No comando os Dj's Tworems e Orpheus tocarão o que existe de mais clássico dos anos 80 (The Cure, The Smiths, The B-52's, Depeche Mode), os melhores hits dos anos 90 (EMF, Garbage, Hole, Smashing Pumppinks) e o mais atual do rock alternativo mundial (The Strokes, The Hives, White Strippes, Marilyn Manson) e com a participação do Dj convidado Dany Boy. Não percam!
O projeto tem por objetivo fazer todas as quintas-feiras no Space Bar uma festa estilo retrô comandadas pelos Dj’s Tworems e Orpheus e contando sempre com um convidado extra para apimentar a noite.
Informações: 9991.2525
P.S. Eu posto o flyer tão logo o tworems lembrar-se de me passar ele. :)
segunda-feira, 14 de junho de 2004
O significado do amor é muito mais do que apenas querer. Amor é saber juntar partes separadas, e fazer com elas a mais bela configuração. O amor não é apenas pelos outros, e também por você mesmo, qualquer parte de vc.
Uma pessoa que vive dividida nunca será feliz de verdade, e nunca terá toda a sua força à disposição. Amar a si mesmo é tornar-se um. Apenas duas pessoas inteiras podem se amar...
Estou soando filosófico demais?
Então experimente colocar isso tudo em prática para ver o que é filosófico demais. :)
Kayleigh
Marillion
Do you remember chalk hearts melting on a playground wall
Do you remember dawn escapes from moon washed college halls
Do you remember the cherry blossom in the market square
Do you remember I thought it was confetti in our hair
By the way didn't I break your heart?
Please excuse me, I never meant to break your heart
So sorry, I never meant to break your heart
But you broke mine
Kayleigh is it too late to say I'm sorry?
And Kayleigh could we get it together again?
I just can't go on pretending that it came to a natural end
Kayleigh, oh I never thought I'd miss you
And Kayleigh I thought that we'd always be friends
We said our love would last forever
So how did it come to this bitter end?
Do you remember barefoot on the lawn with shooting stars
Do you remember loving on the floor in Belsize Park
Do you remember dancing in stilettoes in the snow
Do you remember you never understood I had to go
By the way, didn't I break your heart
Please excuse me, I never meant to break your heart
So sorry, I never meant to break your heart
But you broke mine
Kayleigh I just wanna say I'm sorry
But Kayleigh I'm too scared to pick up the phone
To hear you've found another lover to patch up our broken home
Kayleigh I'm still trying to write that love song
Kayleigh it's more important to me now you're gone
Maybe it will prove that we were right
Or ever prove that I was wrong
Às vezes a gente acredita nas coisas erradas
e busca as coisas erradas
e enxerga o mundo ao contrário e...
bem...
nestas situações não é supresa que a gente faça merda.
Eu fiz de propósito
mas não sabia o que estava fazendo (o que também não é novidade).
And i still miss the cigarrettes by the window
and the bliss of real closeness...
E então o bardo se juntou a seus companheiros sobre a colina e lutou o seu combate, e enfrentou o seu medo, e enfrentou seu inimigo e encontrou a glória. E junto a seus companheiros, seus irmãos e irmãs em armas, ele festejou.
Hoje o bardo aprendeu a cavalgar seu dragão, e também a amá-lo.
Ele está feliz.