Daniel Duende é escritor, brasiliense, e tradutor (talvez nesta ordem). Sofre de um grave vício em video-games do qual nunca quis se tratar, mas nas horas vagas de sobriedade tenta descobrir o que é ser um blogueiro. Outras de suas paixões são os jogos de interpretação e sua desorganizada coleção de quadrinhos. Vez por outra tira também umas fotografias, mas nunca gosta muito do resultado.

Duende é atualmente o Coordenador do Global Voices em Português, site responsável pela tradução do conteúdo do observatório blogosférico Global Voices Online, e vez por outra colabora com o Overmundo. Mantém atualmente dois blogues, o Novo Alriada Express e O Caderno do Cluracão, e alterna-se em gostar ora mais de um, ora mais de outro, mas ambos são filhos queridos. Tem também uma conta no flickr, um fotolog e uma gata branca que acredita que ele também seja um gato.

quarta-feira, 22 de outubro de 2003

gosto do gosto

Eu gosto de assimetrismos,
de coisas em seu lugar
e fora deles.
Eu gosto de banhos de chuva
e de pessoas que tomam banhos de chuva
Eu gosto de coisas naturais
e de coisas bem fabricadas.
Gosto de roupas rústicas
coloridas ou não
Gosto de pessoas delicadas,
educadas, ou não.
Gosto de sinceridade
e de coisas expontâneas
que fazem os tolos corarem.

Eu gosto de pele, de toque, de afago
e de ter espaço
e de partilhá-lo.
Eu gosto de andar e ver gente
e por vezes gosto de ficar parado
e não ver ninguém
exceto quem
eu quero ver.
Eu gosto de biscoitos de pimenta
e do suor do dorso de quem desejo.
Eu gosto de manusear objetos
e tocar o que é macio de se tocar
o que é liso, o que é rugoso
o que é gostoso
e o que é de se ter.
Eu gosto do que se tem para fazer
e por vezes eu simplesmente
não gosto de fazer
o que querem que eu faça.

Eu gosto de descobrir a nudez
e de cobrir o que tem frio
e proteger o que é frágil.
Eu gosto de sucos bem doces
e de muitos copos de água
depois de uma cervejada.
Eu gosto de alças que caem
e de cabelos que o vento leva.
Gosto de pessoas que dançam
mesmo sem música
e de pessoas que tem a própria música
batendo no peito.
Eu gosto, sobretudo de quem tem peito
e de quem sabe ter peito
para não se dobrar
aos que só tem covardia.

Eu gosto dos meus cigarros
e eu entendo quem não gosta deles.
Eu tenho meus vícios,
minhas fixações, meu erros.
Gosto de gostar de mim
e de quem gosta
de gostar de mim
por que gosta do gosto
que eu tenho
quando estou assim
perto.

Eu gosto quando coçam as minhas costas
e quando leem minhas poesias
mesmo as mais longas
mesmo as mais sinceras.
Eu gosto de quem gosta do que faço
do que digo
do que sou.
Eu gosto quando concordam comigo
mas só um pouco
para que não pareça
apenas uma repetição
do que sou. (eu tenho espelho pra isso)

Gosto de vestir roupas estranhas
por que elas são como eu sou.
Gosto de fazer o que quero, quando quero
e aceito que isso seja difícil e caro de ser feito.
Eu gosto quando a vida sorrí
e quando ela chora
eu choro. Eu gosto de chorar.
E gosto quando me pegam no colo
para me deixar chorar.

Gosto de pessoas que sejam livres
para tirar e por
para ficar ou ir embora.
Gosto de campeonatos de cuspe a distância
e coisas toscas que pessoas sensiveis
não gostam de comentar.
Eu gosto de pores do sol
quando tenho paciência
e tempo para ver pores do sol.
Eu gosto de dormir antes, depois ou durante
o nascer do sol
mas não gosto de dormir sozinho.

Eu gosto de quem tem cheiro
de quem tem gosto
de quem tem rosto
e coração.
Gosto de quem passa a mão,
de quem sente,
de quem diz
o que sente
e quando a pele rala o dente
sabe ser tesão.

Eu gosto de ouvir musica alta
e de ouvir o silêncio.
Eu gosto de falar muito,
emendar um assunto no outro
ou ficar calado e nem sequer responder
quando me chamam.
Eu gosto de me sentar parado
e de pular de um lado para outro
imitando algum animal.
Gosto de coisas ridículas,
patéticas, sem sentido...
E gosto de encontrar um sentido
para tudo que não tem sentido
e de brincar com o sentido
das coisas,
mas nunca com o sentimento
das pessoas.

Eu gosto do que é belo
por que sou humano.
Eu vejo a beleza das coisas
por que a beleza está
nos olhos de quem a vê.
Eu não gosto do que é feio
e do que é feito
para ser feio. Mas eu gosto
de coisas estranhas
que causam ânsia e pavor
por que me trazem
o novo, vigoroso, aos olhos.
Eu gosto de tatuagens, piercings,
cores e enfeites. Gosto do excesso
por que a falta
é apenas ausência...

Eu gosto de palavras
e gosto das coisas
que são maiores do que as palavras.

Eu gosto de mim
e eu gozo de mim
e eu gosto
de quem gosta de mim.

Eu gosto...
Você gosta?
Então vem ver se eu estou afim.

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